
Criada pelos lendários quadrinistas Jack Kirby e Stan Lee, o quadrinho Uncanny X-Men (Fabulosos X-Men) fez sua estreia nos anos 60 mas foi só em 1976, sobre a escrita de Chris Claremont, que as histórias e a equipe começaram a se assemelhar ao padrão que vemos hoje com a adição de mutantes como Vampira, Psylock, Dentes-de-sabre e Gambit. É muito provável que aqui no Brasil os mais velhos tenham tido seu primeiro contato com a equipe por meio dos desenhos X-Men: The Animated Series, que passou nos anos 90, e X-Men Evolution, que foi reprisado por muitos anos na TV aberta. Os mais novos devem conhecê-los melhor pelos filmes que vem sendo lançados desde o ano 2000.
Eu acabo sendo da turminha que os conheceu pelo X-Men Evolution no Bom dia e Companhia, sendo minha lembrança mais antiga deles a que eles aparecem no desenho do Homem-Aranha que passava na Fox Kids. Meu contato mais duradouro com os X-Men na infância acabou sendo por meio do Children of the Atom no SEGA Saturn, onde eu acabava ficando com bolhas nos dedos tentando mandar os golpes especiais. Acabou sendo um dos jogos que eu mais joguei no console mesmo não sendo bom nele, algo que não mudou ate hoje.
Um fã da Marvel dentro da Capcom
Sendo uma obra muito aclamada e rentável, é logico que receberia muitos produtos licenciados e jogos não ficaram de fora. X-Men não havia sido o primeiro contato da Capcom com os heróis da Marvel, sendo a estreia com o beat’ em up de The Punisher, estilo em que a Capcom já tinha trabalhado antes e feito um bom serviço. Metade do mercado de arcades era representado pela América do Norte, então faria muito sentido fazer jogos focados naquele mercado, mas a decisão de buscar licenças da Marvel veio de um fã de quadrinhos americanos chamado Katsuya Akitomo, que trabalhou em The Punisher, Captain Commando e Darkstalkers. Ele tinha o costume de dar quadrinhos aos artistas com quem trabalhava para servir de inspiração, chegando até mesmo a traduzí-los para equipe conhecer as histórias. Seu fanatismo era tanto que até seu cartão de visita tinha “Marvel Fan” como seu nome. Embora não seja creditado em Children of the Atom, sua dedicação foi um fator importante para conseguir os direitos da Marvel e apresentar o universo Marvel para os funcionários da Capcom.
Embora a Capcom tivesse conseguido licenciar os personagens da Marvel, eles ainda não tinham ideia de que tipo de jogo eles deveriam fazer. A Capcom dos Estados Unidos queria um jogo de luta e que fosse com personagens populares e, durante esse período, X-Men era extremamente popular entre os jovens. O planejamento ficou a cargo de Akira Nishitani, que havia trabalhado na mesma função em Street Figther 2 e Final Fight. Ele tinha a possibilidade de trabalhar em “Street Figther 3”, mas optou por algo novo, sentindo que não poderia fazer muito pela serie Street Figther além do que já tinha feito sem mudar a base do jogo.
Estilo dos super-heróis
Um grande desafio de se trabalhar com obras licenciadas é transportar a estética de uma obra para outra mídia. Durante as gerações passadas, não era possível reproduzir com fidelidade os personagens. No máximo eles eram reconhecíveis, mas estavam longe de transmitir a sensação de fidelidade, ainda mais quando falamos de obras que possuem personagens muito destoantes entre eles. Essa dificuldade acabou sendo maior por ter sido feita por uma equipe japonesa que não possuía muito contato com quadrinhos americanos. Existiam obras que se inspiravam na cultura e estética americana feita por japoneses como Captain Commando, mas elas nunca pareciam autênticas, por isso o esforço em apresentar os envolvidos aos quadrinhos foi de vital importância para o desenvolvimento do visual do jogo.

Até aquele momento, os sprites costumavam carecer de personalidade. Isso era algo que não vinha necessariamente de potência gráfica pois, mesmo em jogos da mesma geração, pode haver uma grande diferença nas posturas de um mesmo personagem. Comparando X-Men (Genesis) com X-Men Mutant Apocalypse (Snes) é possível ver que, mesmo entre sprites de basicamente o mesmo tamanho, um consegue captar muito mais a agressividade do Wolverine pela sua postura. A qualidade dos sprites vai além de um simples quadro estático. A animação feita para esse jogo contém uma fluidez incrível de se observar em personagens como Wolverine, Omega Red, Spiral e Sentinel. Fluidez essa possível graças à CPS-2, a nova placa de Arcades da Capcom que chegou junto do Super Street Fighter II: The New Challengers, em 1993. Mas seria só em 1994, com a chegada de jogos como Dungeons & Dragons: Tower of Doom, Darkstalkers: The Night Warriors, Armored Warriors e o próprio X-Men: Children of the Atom, que seu poder ficaria evidente.
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A Capcom havia caprichado nas arenas de Street Fighter II e Darkstalkers, mas os X-Men as levarem a um novo nível, tornando-as inovadoras e bem imersivas, algo que seria recorrente nos próximos jogos de luta com os personagens da Marvel. Os lutadores agora estavam em um novo patamar de poder onde alguns poderiam destruir tudo por onde passavam e, por isso, as arenas não conseguiria sair intactas dos combates. Arenas bem detalhadas contando com movimentação, destruição e até mesmo outras secções, conseguiam manter as lutas empolgantes além de refletir as lutas épicas entre heróis e vilões. Esses pequenos detalhes somados acabam criando uma composição bem imersiva e expressiva, bem mais que nos jogos anteriores do grupo de heróis, onde, algumas vezes, os personagens eram pequenos e não conseguiam transmitir muito bem as emoções que se deveria passar. Exemplos disso são as lutas contra o Juggernaut, em Spider-man and the X-Men – Arcade’s Revenge, onde o vilão não é intimidador como em Children of the Atom.


Atração Fatal e elenco
Como história para o jogo, foi usado o arco “Atração Fatal” publicado em 1993. O arco conta a história do retorno de Magneto, junto de seus acólitos, com o plano de atacar os campos magnéticos da Terra para inviabilizar o uso de aparelhos eletrônicos a fim de jogar o planeta em uma idade das trevas enquanto leva os mutantes para viver numa estação espacial chamada Avalon. A história é irrelevante para o jogo, que acabou se espelhando muito pouco nela a ponto de que um dos únicos momentos em comum é a batalha final em Avalon. Esse pouco “aproveitamento” da história original não chega a ser um ponto negativo, mas abre certos questionamentos, como o personagem Colossus que possui relevância no arco dos quadrinhos, mas é completamente ignorado no enredo do jogo. Em Atração Fatal, o personagem sofre com o luto por sua irmã e isso o leva a abandonar a pintura e se aliar a Magneto. Dentro dos arquivos do jogo, existem sprites dele pintando (que provavelmente seriam de seu final), mas acabou sendo genérico, sendo ele treinando na sala de perigo. Um final dele pintando os X-Men faria muito mais sentido com a historia original.

No quadrinhos, ao invadir a estação espacial de Avalon, os X-Men participantes foram Wolverine, Gambit, Jean Grey, Xavier, Mercúrio e Vampira. Quando se olha o elenco presente no jogo, percebe-se que a maioria não está presente no jogo. O mesmo ocorre no time dos vilões. Durante o desenvolvimento do jogo, Gambit e Vampira foram considerados mas, por divergências internas, eles acabaram sendo excluídos, embora tenha sido incluídos em jogos futuros da Capcom como personagens jogáveis. Possui um belo elenco para um jogo de luta, com personagens bem carismáticos e estilos de jogo diferentes entre si mas aposto que, jogando o jogo, muitos pensaram que um ou outro personagem desconsiderado no desenvolvimento deveria estar presente.
Jogabilidade
O jogo conta com os mesmos moldes de controle de Street Figther: seis botões de ataque, sendo três de soco e três de chute. Pensando nos jogadores novatos e mais casuais, foram implementados o sistema de bloqueio automático e facilitação de combos, o que acabou tornando possível combos mais longos (graças aos golpes mais fáceis de se emendar). Claramente, esse novo sistema de combos acabou recompensando os jogadores mais dedicados, que agora tinham uma nova gama de possibilidades que se estendia às lutas aéreas. Na mobilidade, houveram duas inclusões: a corrida (que poderia ser realizada ao ir para frente ou trás duas vezes seguidas ou apertando dois botões de soco) e o Super pulo (que é realizado ao abaixar e pular em seguida). Ambas as mecânicas permitiram um dinamismo ainda maior nos combates, além de explorar mais as diferenças entre um mesmo golpe especial, como por exemplo, no caso do Omega Red e seu Carbonadium Coil. No chão, o golpe pode ir para três direções diferentes dependendo do botão apertado no final do comando. No ar, o mesmo golpe pode ir para cinco direções diferentes. Além da gama de possíveis situações ter sido ampliada, também foram incluídas reações em resposta dessas possíveis ações.
No combate, foi adicionado um sistema de resposta ao agarrão. Nele existiam duas possibilidades: o safe faller, que permitia fugir ou reduzir os danos ou cair em pé dependendo do momento que a resposta era dada, isso ao custo de parte da barra de especial e o Counter Throwers, que fazia uma disputa usando como parâmetro aquele que possuía mais barra de especial onde o vencedor realizava o agarrão no final da disputa. Todos os personagens possuem uma dessas duas opções e, para realizá-las, basta apertar os três socos enquanto segura o direcional para baixo. Outra mecânica implementada acabou não sendo novidade: o sistema de especial, que já estava presente nos outros jogos. A novidade aqui foram os níveis de poder e as formas de gastá-los. Fora os especiais quase obrigatórios dos jogos de luta, dessa vez, o jogo possuía, também, as X-Abilities: especiais com efeitos variados, como aumento de força ou velocidade. Vale lembrar que alguns personagens não possuíam nenhuma X-Ability, enquanto outros possuíam mais de uma.
Recepção e Ports
Era esperado um grande sucesso no ocidente. Eles conseguiram isso no arcade que contou com uma ótima recepção e popularidade. No ano seguinte, o jogo recebeu um port para o Sega Saturn que possuía uma boa performance e aparência, mesmo tendo cerca de um terço dos sprites deletados, sendo a melhor versão “caseira”. Infelizmente, as outras versões não foram tão boas. A de PC era inferior a de Sega Saturn e acabou tendo uma recepção mista, mas o verdadeiro desastre foi a versão de PS1, lançada três anos depois do port do Sega Saturn. O jogo contava com uma péssima performance e ainda mais sprites deletados, fazendo os combates feios e nada fluídos. Sua recepção foi péssima. O port havia sido anunciado para novembro 1996 e todo o tempo a mais acabou não servindo para nada. Seu lançamento foi tão demorado que os outros jogos de luta da Marvel desenvolvido pela Capcom já estavam com ports quase prontos para o PS1, ou seja, mesmo que o port fosse bom, ele iria ficar à sombra das “sequências” que seriam lançadas em breve.



Children of the Atom foi desenvolvido junto de Marvel Super Heroes, que acabou sendo lançado nos arcades um ano depois de seu “antecessor”. A Capcom estava a todo vapor com os jogos licenciados da Marvel. Creio que nem eles imaginavam que esse primeiro contato levaria à um dos mais aleatórios e queridos crossovers do mundo dos games. Embora o último lançamento da Capcom envolvendo a Marvel não tenha tido uma boa recepção, o amor dos fãs ainda dura. Usando como base os jogos já existentes e ferramentas como M.U.G.E.N, ainda existem pessoas criando mods, jogos e personagens que acabaram ficando de fora dos projetos oficiais.
Tanto os jogos quanto os quadrinhos contam com fãs bem fiéis e dedicados. Ainda hoje existem grupos interessados nesse clássico. Fiquei realmente surpreso ao encontrar a organização de um torneio online (@xmcota_official) e até mesmo guias dos personagens desse jogo. Mesmo que seja uma comunidade pequena, é legal saber que um jogo com mais de 20 anos ainda consegue reunir pessoas interessadas em competir e se divertir com ele.
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