
Desenvolvedora: Nihon Falcom
Publicadora: NIS America
Gênero: RPG de ação e baseado em turnos
Data de lançamento: 05 de julho, 2024
Preço: R$ 314,99
Formato: Digital, Físico
Análise feita no Nintendo Switch com cópia fornecida gentilmente pela NIS America.
Revisão: Marcos Vinícius
The Legend of Heroes: Trails through Daybreak é um novo recomeço para a série Trails. O jogo é um novo capítulo da narrativa geral da série, deixando para trás personagens e locais já conhecidos dos fãs para introduzir um novo elenco e novos locais, além de apresentar novos elementos e atualizar a jogabilidade, dando assim uma nova cara para a franquia.
Um necessário ar de mudanças
A série Trails possui um peculiar elemento que a distingue de seus contemporâneos do gênero JRPG: sua contínua narrativa que cresce a cada novo jogo lançado. Enquanto outros JRPG’s geralmente fazem um ou dois jogos com uma narrativa contínua, ou lançam múltiplos títulos sem relação um com o outro, a Trails, no entanto, possui uma longa história que já consiste em 11 jogos.

Enquanto por um lado isso significa que aqueles que jogam desde Trails in the Sky podem aproveitar uma rica narrativa que evolui a cada novo título, isso também resulta em uma problemática para quem desejam experimentar a série e podem não gostar da ideia de ter que jogar 10 títulos só para ficar a par dos fatos mais atuais de sua história. Inclusive, os dois últimos arcos da história, que cobrem os eventos de Crossbell e Erebonia — duas das principais nações do mundo onde os jogos se passam —, também sofrem bastante com grandes problemas de pacing, especialmente em relação a finalizar algumas histórias deixadas em aberto nas narrativas de títulos anteriores.

Trails é uma série que estica demais o que poderia ser resolvido de forma mais rápida ou mais simples. Este é um problema de narrativa que atingiu seu ápice nos últimos jogos, com a existência de Trails into Reverie sendo talvez a maior prova desse problema. O jogo existiu apenas para fechar uma parte da saga que já poderia ter fechado no jogo anterior, Trails of Cold Steel IV. Além da história, os jogos também começaram a sofrer com elencos cheios de personagens e uma contínua necessidade de explorar os mesmos locais por vários jogos seguidos.
Resumindo: Trails era uma série que estava estagnada. Assim como é o caso com séries em outros formatos que existem por muitos anos, a franquia estava se movendo a passos lentos e presa a uma fórmula que não apresentava grandes mudanças entre os diferentes títulos lançados. Era necessário ter paciência para aproveitar seus jogos e uma boa memória para lembrar eventos mencionados em jogos passados ou só não se perder no meio de complicadas trilhas narrativas que começaram há mais de 10 anos.
Apesar de não ter se livrado de algumas manias que já estão muito interligadas com o DNA da franquia, Trails through Daybreak é um sopro rejuvenescedor que a série precisava. O jogo marca o início de um novo sub-arco dentro da narrativa geral da franquia, introduzindo o lado oeste do continente de Zemuria, que não apenas o afasta de tudo que veio antes, mas funciona perfeitamente como um novo ponto de entrada para a série.
Caminhando a tênue linha da moralidade

A narrativa de Trails through Daybreak ocorre na capital da República de Calvard, que se encontra em um período de expansão econômica após a guerra com o Império de Erebonia. Junto com a expansão de negócios honestos, o submundo também se expandiu e novas forças começaram a marcar sua presença nas sombras da sociedade.
O novo protagonista da história é Van Arkride, um velho de 24 anos, sim, porque assim como nos animes, qualquer um acima de 20 anos é velho, que possui seu negócio próprio, a Arkirde Solutions. Van trabalha como um spriggan, um faz-tudo, assim por se dizer, oferecendo seus serviços para qualquer um que possa lhe pagar. Recusando apenas trabalhos que afetam seu código de honra pessoal, Van é alguém que anda na tênue linha da legitimidade, cumprindo trabalhos que vão desde encontrar pessoas perdidas a transportar materiais que ainda não são considerados legais em Calvard.
A narrativa começa quando a estudante de uma das principais escolas de Calvard, Agnès Claudel, contrata Van para lhe ajudar a encontrar os Oct-Genesis, oito misteriosos artefatos que foram deixados para trás por seu tataravô, o lendário cientista Claude Epstein. Encontrando o primeiro faz com que Van descubra um poder misterioso dentro de si, além de bater de frente com um novo grupo terrorista que está começando a ganhar poder dentro do submundo de Calvard, a Almata. Apesar de concordar em continuar ajudando Agnés, a garota acaba se oferecendo para trabalhar com Van e os dois começam a ir em busca dos Oct-Genesis enquanto exploram as múltiplas facetas da sociedade de Calvard.

Apesar de seguir elementos similares ao encontrado em jogos passados, Trails through Daybreak tem uma vibe bem diferente de seus antecessores. A moral é um dos principais temas narrativos de sua história, e o jogo apresenta uma nova visão sobre vários elementos que eram comuns nos jogos passados, além de permitir que um novo tipo de história seja contada sem se prender a dilemas morais que estamos acostumados na série.
Desde Trails in the Sky, a série segue uma fórmula bem básica com seus personagens e jogabilidade. Naquele jogo, assumimos o papel de um par de Bracers, um grupo não governamental que existe em toda a Zemuria e que possui um código moral de proteger os cidadãos acima de tudo. Além da bagagem narrativa, ter os personagens como Bracers também seria como uma bela desculpa para as sidquests, visto que elas eram nada mais nada menos do que o trabalho normal para aquele grupo.

A duologia Zero/Azure já mudava um pouco as coisas. Agora éramos parte da polícia de Crossbell, um esquadrão especial, a SSS, que apesar de ser um esquadrão policial, trabalhava num esquema similar ao de Bracers, aceitando missões dos cidadãos e colocando a proteção e cumprimentos de suas leis acima de tudo.
Cold Steel colocou estudantes de uma classe especial como protagonista de suas aventuras. Dentro do lore da série, a classe tinha como objetivo recriar o sistema dos Bracers e para isso eles também aceitavam missões dos cidadãos e colocavam sua proteção em primeiro lugar, além, é claro, de buscar resolver as coisas de uma forma que fosse boa para todos.
Estes três arcos nos colocavam no controle de personagens e grupos que tinham uma moral bem simples e típica de histórias do gênero. Tudo era bastante preto e branco, com uma distinção óbvia sobre o bem e mal e sem muita forma de exploração das várias nuances que podiam existir envolvendo certos grupos e personagens que outrora eram apresentados como vilões das histórias. Clássicos elementos como o poder da amizade e superação de obstáculos por ser a coisa certa a se fazer, além de heróis com personalidades certinhas, eram comuns das histórias de Trails até este momento.
Trails through Daybreak é um pouco diferente nesse quesito. Obviamente ainda temos aqui alguns elementos clássicos de histórias do gênero, como o poder da amizade e outros, mas o jogo em si é mais como um cinza que explora as nuances do mundo de todos os lados visíveis. Van é bem diferente de seus antecessores, ele não é um idealista e nem coloca o bem dos outros acima do seu próprio. Ele também não é de jogar tudo para o alto e ajudar todos que batem à sua porta. Ele é alguém que não tem um lado fixo na linha que divide o bem e o mal, sendo, em suas próprias palavras, um céu azul escuro que existe entre o entardecer e o escurecer da noite.

Van é certamente um dos melhores personagens principais que a Falcom criou nos últimos anos para a série. Ele possui seu próprio código moral e ainda ajuda a maioria das pessoas que aparecem em seu caminho, com muitos outros personagens comentando sobre isso para a irritação de nosso protagonista, mas se comparado a Estelle, Lloyd e Rean, ele é bem diferente. Pode-se dizer que ele é uma evolução natural de C, o terceiro protagonista de Trails into Reverie, alguém que não tem medo de atravessar a linha e ir para um mundo mais “escondido da luz da sociedade” se for preciso para completar seu objetivo. Ele não é o único personagem interessante, o resto do elenco também é muito bom e ajudam a expandir esse olhar neutro sobre Calvard e figuras já conhecidas da série que retornam aqui.
Apesar de possuir algumas figuras recorrentes da série, como Renne e Zin da trilogia de Liberl, além de Fie e um certo personagem dado como morto da quadrilogia de Erebonia, a narrativa não perde tempo focando no passado famoso de tais personagens. Van conhece suas histórias e apenas segue seu caminho e a narrativa, apesar de dar espaço para tais personagens, também decide muito mais focar no novo elenco e no futuro do que abusar da nostalgia como era o caso com os últimos jogos, algo que foi essencial para ajudar Trails through Daybreak a renovar ainda mais a série para o futuro.
Radicalizando o esperado
Trails through Daybreak traz grandes mudanças para o sistema de batalha da série. O título radicaliza elementos e fórmulas que estavam em vigor desde o início da franquia, oferecendo assim uma nova e rica experiência que torna tudo ainda mais dinâmico e faz com que os jogadores precisem readequar velhas estratégias caso desejem prosseguir pela aventura sem problemas.

A principal novidade é um sistema básico de combate em tempo real. Apesar de ser extremamente básico, apenas ataques normais podem ser realizados, ele serve perfeitamente para lidar com inimigos comuns no mapa. Além de atacar com ataques básicos, também é possível realizar um ataque mais forte que coloca os inimigos em um modo Stun, que concede vantagem quando entramos nas batalhas por turnos, que podem ser alternadas com um simples toque de botão.

As principais batalhas ainda ocorrem no tradicional formato de turnos misturado com elementos táticos que a série é conhecida, mas dessa vez as coisas estão um pouco mais soltas. Se antes os jogadores precisavam alternar entre ataques e movimentos, agora finalmente é possível se movimentar livremente sem desperdiçar turnos. Essa pequena mudança quebra regras fundamentais que a série se baseia e ajuda, meio que negativamente, a tornar as batalhas ainda mais fáceis. O game também adiciona finalmente uma opção de defesa, ajudando ainda mais os jogadores a sobreviverem aos duelos.
Outra grande mudança tem relação com os turnos. Trails through Daybreak separa os turnos dos membros da party e dos inimigos com ambos os lados ainda disputando para decidir quem ataca primeiro, contudo, dessa vez, os bônus que surgem durante certos turnos, como críticos e recuperação de HP/EP/CP, são exclusivos para o lado que surgem. Em jogos passados, os jogadores eram incentivados a sempre tentar roubar turnos dos adversários, seja com crafts e magias que ajudassem a se mover mais rapidamente ou simplesmente com os S-breaks. Trails through Daybreak muda isso completamente ao colocar bônus exclusivamente para um dos lados. Ainda é possível roubar turnos, mas a recompensa é inferior se comparada aos jogos passados.

As próprias S-Crafts também funcionam de forma diferente aqui. Elas agora só necessitam de 100 CP para serem utilizadas, permitindo que spams de S-craft sejam feitos com maior facilidade, porém, para ativá-las é necessário um segundo elemento, que é introduzido neste jogo, o Boost mode.
O Boost Mode é a nova adição do sistema de batalha que entra no lugar das Brave Orders dos últimos títulos. Ele funciona como o próprio nome sugere, um boost para seus personagens. Sendo uma barra separada, é possível ativar até dois níveis do Boost Mode que melhoram atributos e concedem outras melhorias aos personagens, as melhorias que ele oferece, contudo, variam dependendo dos quartz equipados ao Xipha dos personagens.
Os quartz também sofreram uma nova mudança. Os personagens agora são equipados com o Xipha, uma versão diferente do Orbment disponível na Região Leste de Zemuria, que oferece novas opções de customização dos quartz. Além de oferecer magias e melhorias nos atributos, coisa que já era comum nos títulos passados, os quartz em Trails through Daybreak também oferecem habilidades passivas que são ativadas ao longo dos duelos, adicionando um quê de estratégia ao combate.

Existe também um terceiro tipo de batalha especial em Trails through Daybreak relacionado a história do jogo. Nele, Van se transforma em um poderoso demônio chamado Grendel e o combate se torna um pouco mais linear. Funcionam quase similar ao combate com os Divine Knights da série Cold Steel, mas com a utilização da party em certos momentos.
Por fim, o sistema de Combat Link de Cold Steel também foi removido, dando espaço a um sistema mais livre. Agora, basta colocar dois personagens próximos um do outro para que eles automaticamente ataquem juntos ou concedem bônus de poder ao se utilizar Arts ou Crafts.
Essas mudanças e adições fazem com que o sistema de batalha de Trails through Daybreak seja bem diferente dos seus antecessores, mas também traz uma maior facilidade ao título. Trails through Daybreak é o jogo mais fácil da série e isso pode decepcionar um pouco aqueles que gostam de JRPG’s desafiadores.
Superando seus limites

Trails through Daybreak é o primeiro jogo desde Trails of Cold Steel que utiliza uma nova engine gráfica. Deixando para trás uma engine desenvolvida com as limitações de consoles como PS3 e PSVita para trás resultou em novas formas da Falcom apresentar a narrativa, com novas animações, além de oferecer uma maior liberdade aos jogadores na hora de explorar seus ricos cenários.
Pela primeira vez na série as telas de loading se resumem a carregar um mapa novo, com todas as lojas e casas sendo acessíveis sem precisar de carregamentos adicionais. Os mapas também são maiores do que em jogos passados e todos funcionam muito bem no Switch, com quedas de frames ocorrendo de forma mais sutil que nos títulos passados. O game também está bem otimizado para a plataforma, sem erros ou bugs aparecendo durante minha jogatina, uma surpresa, especialmente quando comparado com o lançamento inicial de Reverie.

O estilo artístico também sofreu mudanças para Trails through Daybreak, que funciona muito bem com a premissa narrativa deste arco. Ainda há influências de anime nos designs e visuais do jogo, mas a nova arte se destaca bastante. Este é o jogo mais belo da franquia, especialmente nos modelos de seus personagens e efeitos visuais das Crafts.
A música também sofreu mudanças com o compositor Mitsuo Singa assumindo como um dos principais, criando um fenomenal tema de batalha que sofre variações dependendo do estilo da mesma. Calvard também faz uma interessante mistura de estilos musicais para ajudar a indicar que esta é uma região bem diferente do que estamos acostumados. Por fim, temos a opção de dublagem em inglês e japonês como já é costume.
A trilha que abre caminhos esperançosos
Trails through Daybreak é uma agradável surpresa que a franquia Trails estava precisando. O game é um sopro de vida trazendo mudanças significativas em sua jogabilidade e apresentando uma narrativa que busca trazer um olhar diferente do que esperávamos e que foca muito mais no futuro sem precisar olhar tanto para seu passado. Este é um dos melhores títulos de entrada na série e o ideal caso você queira experimentar um Trails mais moderno.

Ele possui pequenos problemas, como a falta de dificuldade e ainda arrastar um pouco as coisas em certos momentos, mas de uma forma geral, seus pontos positivos superam seus problemas. O elenco é cativante, a jogabilidade é rápida e dinâmica e a história é contida e com muitas reviravoltas interessantes. Sem mencionar que este é o melhor port da série até o momento no Switch.
Como alguém que já estava cansado da monotonia e enrolação que a série estava fazendo com seus últimos lançamentos, The Legend of Heroes: Trails through Daybreak me encantou bastante, de uma forma bem similar ao que o primeiro Cold Steel fez lá em 2015. Este é simplesmente um dos meus jogos favoritos deste ano até o momento e uma excelente pedida para os amantes de JRPGs.
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