
Desenvolvedora: MaleDoll
Publicadora: Eastasiasoft
Data de lançamento: 12 de Janeiro, 2023
Preço: R$ 76,00
Formato: Digital
Análise feita no Nintendo Switch com chave fornecida gentilmente pela Eastasiasoft.
Revisão: Paulo Cézar
Burrow of the Fallen Bear é uma visual novel erótica da MaleDoll, um estúdio brasileiro fundado pela drag queen Victória Invicta. A desenvolvedora tem como visão se tornar uma referência na produção de jogos LGBTQ+, explorando questões de gêneros e sexualidade em seus títulos. Assim como foi no caso de Freezer Pops – outro jogo da MaleDoll publicado no Switch pela Eastasiasoft –, o foco deste jogo está em personagens homossexuais, mas desta vez explorando o universo dos animais antropomórficos, os furries.
Um aventureiro sonhador e uma equipe excêntrica

Burrow of the Fallen Bear conta a história do jovem Krile, um gatinho ladino que sonha em um dia ser um grande herói. Em um universo no qual há versões antropomórficas de animais variados e até mesmo dragões são reais, os grandes ídolos da população são os Furry Heroes, um grupo de cinco aventureiros que protegeram o mundo antigamente. Embora tenham sofrido uma maldição há quase três séculos, o seu legado ainda perdura na sociedade.
Para provar as suas habilidades e talvez acabar com a maldição que acometeu os Furry Heroes, Krile parte em direção a uma das masmorras mais antigas do reino, a Toca do Urso Caído. Apesar dela ter sido lacrada por muitos e muitos anos, o selo mágico que a envolvia está se rompendo, fazendo com que alguns aventureiros se reúnam nas suas proximidades.

Nas barracas ao redor da toca, Krile encontra alguns rapazes atraentes, cada qual com um temperamento diferente. Primeiramente, Boris é um urso dedicado à medicina e à deusa Birdenius. Curar as pessoas é sua paixão e ele é um indivíduo muito gentil, então ele nem mesmo cobra pelas consultas.
Entre as tendas mais ilustres, temos Grivoth, um mago cuja raça é composta por criaturas manipuladas geneticamente através de cruzamentos. Ele especificamente é um meio-leão, meio-dragão e tem uma personalidade bem egocêntrica. Trabalha como um pesquisador de elite do reino e é bastante famoso.

Temos também o arredio Ulfric, conhecido como o “Caçador Prateado”. Esse lobo cinzento é o último de sua tribo e vilaniza os Furry Heroes frequentemente. Conhecido por seu temperamento e por já ter sido preso várias vezes, ele não mede suas palavras e está sempre com insultos e palavras de baixo calão na boca.
Além desses personagens, Sylvester é uma raposa arqueira que atua como uma espécie de Robin Hood. Ele também se envolve na trama, mas mais ocasionalmente e não é considerado um dos potenciais interesses românticos do protagonista apesar de ter algumas cenas especiais na trama.
Representando sexo em um console

De forma geral, a trama de Burrow of the Fallen Bear cumpre o que é esperado em boa forma. Krile investiga a Toca, enfrentando alguns perigos e se aproximando de forma íntima dos seus parceiros. Conhecer os personagens mais a fundo é também aprender sobre as suas circunstâncias e passados, que envolvem não apenas dramas pessoais envolventes como também uma interessante discussão sobre como essa sociedade medieval opera dentro de questões raciais, econômicas e políticas. É tudo bem simples, mas executado de uma forma orgânica que vale a leitura.
Ao mesmo tempo, é importante ter em mente que o protagonista e os outros personagens são indivíduos sexualmente ativos e que enxergam a prática como uma questão casual. Por conta disso, há vários momentos em que os personagens decidem ter uma parada para descansar e convidam o gatinho Krile (como parceiro passivo) para o ato de uma forma discreta mas clara com uma simples leitura de entrelinhas.

Dependendo de como o jogador se envolve com esses personagens, receberá pontos de relacionamento que permitirão obter finais específicos. Neles, Krile firma a sua intenção de ficar com apenas um deles ou seguir sozinho para realizar o seu desejo de encontrar os Furry Heroes.
Curiosamente, dentre os jogos que experimentei no Switch até o momento, este é o que teve a representação mais explícita de sexo até o momento. As cenas de fato acontecem, mas o jogo intencionalmente dá um zoom no rosto dos personagens para que os órgãos genitais não sejam mostrados. Porém, o texto continua deixando claro o ato, assim como as expressões de prazer dos rostos dos personagens e há até mesmo o som de ejaculação.

Isso é uma escolha muito ousada para um jogo em console, tendo em vista que jogos de sexo explícito não são permitidos e essas cenas são normalmente cortadas totalmente nesses jogos ao sair do PC. Esse é o caso de várias visual novels japonesas que originalmente possuíam esse tipo de conteúdo, como Aokana: Four Rhythms Across the Blue, Hashihime of the Old Book Town, Secret Kiss is Sweet and Tender e Butterfly’s Poison; Blood Chains.
É uma pena que as desenvolvedoras são forçadas a esse papel, não tendo sequer a oportunidade de fazer, por exemplo, um lançamento ou DLC exclusivamente disponível para público adulto como ocorre, por exemplo, no Steam ou em outras lojas de PC como MangaGamer ou Johren. (A JAST USA também vende esses jogos, mas não separa uma “seção adulta” do site.) Afinal, se é possível vender um jogo proibido para menores de 18 anos por violência exacerbada, a forma como um conteúdo tão mundano como sexo explícito é tratada em consoles é francamente patética.
Um bando de defeitos

Apesar das qualidades que mencionei acima, preciso destacar também que o jogo conta com vários pequenos problemas que se acumulam para enfraquecer a experiência. O mais gritante deles é a qualidade da escrita em português, a ponto de que eu francamente aconselharia a quem puder dar preferência ao inglês. Mesmo sendo desenvolvido por uma equipe brasileira, o jogo parece ter sido escrito em inglês e posteriormente traduzido e o resultado está longe do que eu consideraria bom.
Há muitos erros e inconsistências, que incluem elementos da interface mantidos em inglês, erros de conjugação e concordância mantida em inglês, várias vezes em que Ulfric é tratado no feminino, termos que ora estão em inglês ora em português, entre outros problemas. Ficou faltando uma revisão competente para garantir a qualidade do texto e isso impacta significativamente a leitura.

Ainda em termos de problemas graves, a transição das falas pode ser um pouco demorada às vezes e isso é especialmente frequente nos momentos de escolha. Por causa disso, é muito, muito fácil apertar o botão para avançar uma fala e acabar tomando uma decisão sem querer antes que ela apareça na tela de fato. O resultado é frustrante e acaba exigindo que o jogador fique bem atento, já que as escolhas podem levar a Krile perder um pouco de sua vida ou até mesmo receber um final ruim.
A mesma coisa ocorre ao apertar o botão B para sair do menu. O B serve para fazer o diálogo passar de forma automática, mas também para fechar menus. Por causa disso, fechar o menu faz com que o jogo comece a rodar os diálogos automaticamente, sendo necessário que o jogador aperte o botão novamente para parar.

Outro detalhe que faz bastante diferença é o fato de que o jogo possui contadores relacionados às escolhas do jogador, mas não mostra isso até que ele obtenha um final. Essa escolha é frustrante, já que dificulta a tomada de decisões estratégicas ao longo da trama. Sistemas similares estão presentes, por exemplo, em vários otome games do Switch (Amnesia: Memories, Birushana: Rising Flower of Genpei e Variable Barricade são apenas alguns exemplos) e podem ser vistos a qualquer momento no menu, ajudando os títulos a terem uma maior qualidade de vida.
Em termos da escrita, gostaria de destacar também um pequeno erro de continuidade que enfrentei jogando. Quando estava fazendo a rota de Grivoth, as minhas boas escolhas levaram à morte de Ulfric em uma certa cena em uma ponte dentro da Toca. Porém, logo em seguida, o personagem aparece para ajudar na próxima cena e Krile nem sequer reage a isso com espanto. Ulfric seguiu vivo após esse ponto.

Por fim, apesar de não serem estritamente um defeito, é importante destacar que o jogo não possui vozes. Há raras ocasiões em que há efeitos sonoros que simulam as vozes dos personagens, especialmente um barulho de miado para quando Krile sofre dano. Pessoalmente, não senti falta e acredito que a obra já funciona sem isso. Outro detalhe bem pequeno é a impossibilidade de usar a tela de toque, algo que torna a experiência um tanto menos agradável do que usual para uma VN no Switch.
Porém, também gostaria de destacar que a obra conta com animações Live2D. Enquanto a maior parte dos jogos do gênero dá preferência para ilustrações estáticas, esses pequenos movimentos dão mais vida e charme aos personagens, que são bastante carismáticos e expressivos. A trilha sonora também é adequada para a trama, mas pouco variada e mediana de forma geral. Confesso que acabava rindo nas cenas de sexo porque a música usada nesses momentos tem um estilo meloso bem típico de vídeos pornô profissionais datados. O jogo ainda conta com uma galeria e conquistas internas.
Uma obra honesta

Burrow of the Fallen Bear é uma visual novel honesta quanto às suas intenções. Com personagens carismáticos e expressivos, ela executa bem o seu mundo furry medieval e a sua abordagem de sexualidade. Porém, a qualidade do texto em português e vários detalhes relacionados à experiência do usuário deixam a desejar. É uma obra que eu particularmente ainda considero agradável para quem se interessa por sua temática, mas que merecia muito mais polimento.
Prós:
- História de fantasia medieval simples, mas bem executada e fechadinha, destacando discussões sociais desse mundo furry alternativo;
- Aborda a sexualidade casual dos heróis de forma consistente, valorizando as relações entre os personagens como algo que impacta as resoluções finais da trama;
- Personagens bastante carismáticos e expressivos com pequenas animações Live2D.
Contras:
- O texto em português é cheio de erros de escrita, inconsistências e alguns problemas típicos de uma tradução mal feita do inglês;
- Transição de falas ocasionalmente travada e que induz o jogador ao erro de selecionar uma opção de diálogo sem nem vê-las;
- Só poder ver os atributos que definem o encerramento ao concluir o jogo dificulta o controle estratégico do jogador;
- Alguns elementos como a presença de cenas de sexo explícito sem a visualização dos órgãos genitais, a ausência de voz e o não-uso da tela de toque devem desagradar alguns jogadores;
- Há um erro de continuidade grosseiro na “cena da ponte”.
Nota Final:
5,5
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