
Revisão: Paulo Cézar
Vamos voltar a 2001, uma época mágica para os jogos portáteis. Mesmo com o Game Boy Advance já no horizonte, o Game Boy Color ainda era febre e estava nas mãos de muitos jogadores na época. Nessa transição entre gerações a Nintendo e a Capcom uniram forças para criar algo especial: The Legend of Zelda: Oracle of Seasons, trazendo uma experiência diferente e inesquecível para os fãs da saga. Junto com seu “irmão gêmeo” Oracle of Ages. Numa jogada inédita na série, esses dois jogos foram lançados simultaneamente, lembrando muito a estratégia de lançamento duplo que é tradição em Pokémon.
Sem nenhuma enrolação, a história é bem básica e começa quando Link é chamado pela Triforce e acaba sendo teletransportado para Holodrum, onde o herói deve resgatar Din, a Oráculo das Estações, das garras do General Onox. Como consequência do aprisionamento da Oráculo, a natureza perde o seu equilíbrio e as estações fogem de controle, jogando aquela terra em um caos climático, além de infestar aquele mundo com hordas de monstros hostis. Caberá ao nosso herói recuperar os oito elementos da natureza para libertar Din e trazer a paz de volta.


Apesar do enredo simples, o que realmente se destaca é a mecânica central do jogo: a habilidade de alterar as estações do ano com o Cetro das Estações. Essa funcionalidade não só muda o visual do mundo, mas também como você interage com ele, trazendo uma camada de criatividade e estratégia que poucos jogos conseguem.
Um detalhe importante que vale a pena ser mencionado, é que a produção deste jogo também marca a primeira vez que Hidemaro Fujibayashi trabalhou na franquia Zelda. Ele mais tarde dirigiria outros títulos da série, incluindo The Legend of Zelda: Breath of the Wild e Tears of the Kingdom, mostrando que seu talento já era evidente desde então.

Mecânicas brilhantes
O Cetro das Estações é a grande estrela de Oracle of Seasons. Com ele, você pode transformar o ambiente, desbloqueando novas áreas e resolvendo puzzles de maneiras criativas. Mudar a estação de verão para inverno, por exemplo, pode congelar lagos, permitindo a passagem sobre eles. A criação dessa mecânica foi uma jogada de mestre, que fez com que a exploração sempre ficasse com um ar de novidade durante a aventura.
Os puzzles, apesar de simples, são um teste contínuo de criatividade. Desde mover blocos para abrir caminho até usar mudanças de estações para ativar interruptores, cada desafio é bem pensado e oferece uma sensação real de conquista ao ser resolvido. Lembro de um puzzle, que envolvia mudar a estação para fazer as vinhas das plantas cresceram para acessar a entrada de uma dungeon – brilhante e satisfatório.


As masmorras representam o melhor do level design dos Zelda clássicos, cada uma oferecendo um desafio próprio e uma ambientação encantadora. Com destaque especial para a floresta labiríntica das Ruínas Antigas, que chega a ser um dos momentos mais mágicos do jogo. Cada masmorra é projetada com cuidado, misturando puzzles engenhosos e chefes imponentes. A imersão é reforçada pela trilha sonora ambiental distinta, tornando cada estágio uma experiência memorável.
O combate também se destaca. Enfrentar inimigos variados e chefes com padrões diferentes exige adaptação constante. Cada vitória contra um chefe parece uma grande realização, especialmente quando você finalmente percebe os padrões de ataque de cada um. Essa mistura de puzzles criativos e combate intenso mantém o jogo engajante do início ao fim.


Uma elo com Oracle of Ages
A narrativa de Oracle of Seasons, embora funcione bem de forma isolada, é enriquecida pela sua conexão com Oracle of Ages. Jogar ambos os títulos revela uma trama interconectada que se desenrola de maneira surpreendente, especialmente com o uso do sistema de senhas para transferir dados entre os jogos. Isso desbloqueia novos conteúdos e um final especial que une as duas histórias de forma genial.
Essa ligação entre os jogos incentiva os jogadores a zerar ambos para descobrir a história completa. A utilização do sistema de senhas para transferir o save entre os jogos era uma novidade notável para a época, já que não havia nada igual.

Aventura robusta em um pequeno portátil
A criatividade de Oracle of Seasons vai além das mudanças de estações. Uma das mecânicas mais interessantes são os anéis mágicos. Esses anéis, que podem ser encontrados ou comprados ao longo da jornada, concedem a Link diversas habilidades, como aumentar a força, melhorar a defesa ou conferir poderes especiais. Essa customização extra incentiva os jogadores a explorarem cada canto de Holodrum em busca dos anéis mais raros e poderosos, mantendo o jogo sempre interessante e recompensador.
Além dos anéis, o jogo apresenta montarias que tornam a exploração ainda mais divertida. Link pode montar em criaturas como Ricky, o canguru boxeador, que pode saltar grandes distâncias; Moosh, o urso voador, que permite atravessar obstáculos voando; e Dimitri, o Dodongo nadador, que facilita a navegação em áreas aquáticas. Essas montarias não apenas diversificam a jogabilidade, mas também dão um ar de unicidade para a aventura, já que a escolha do animal companheiro é determinada pelas ações que o jogador toma em certo momento da história.


Os NPCs e as missões secundárias adicionam ainda mais personalidade ao mundo de Oracle of Seasons. Personagens como o Bipin e Blossom, com suas histórias interligadas entre os dois jogos, criam um senso de envolvimento emocional com o jogador.
Junto a isso, há outras diversas tramas paralelas e recompensas por ajudar outros personagens, que variam de simples entregas a desafios mais elaborados. Esses elementos fazem com que Holodrum pareça um mundo vivo, onde cada interação conta e cada descoberta é significativa. Explorando essas missões, os jogadores se veem cada vez mais imersos no universo do jogo.
Além da superfície de Holodrum, há um mundo subterrâneo chamado Subrosia, um lugar misterioso cheio de lava, cavernas e segredos – Teria Fujibayashi se inspirado nesse conceito para criar As Profundezas em Tears of the Kingdom? Subir e descer entre o mundo superior e o subsolo expande as proporções da aventura. Este mundo subterrâneo é rico em detalhes, com NPCs e missões secundárias que revelam mais sobre a história e a cultura desta civilização oculta. Por exemplo, descobrir uma tripulação de piratas encalhados em um cemitério, participar de uma cerimônia de dança, missões de furtividade – que parecem até adaptações 8 bits de Breath of the Wild – e diálogos hilários com os Subrosian, os habitantes nativos dali.

O Legado de Oracle of Seasons
Mesmo após mais de duas décadas, Oracle of Seasons continua a ser lembrado por suas qualidades. Foi uma grata surpresa naquela época, onde o Game Boy Color estava prestes a ser substituído pelo Game Boy Advance, o jogo provou que o hardware mais antigo ainda tinha muito fôlego. A capacidade de tirar leite de pedra é uma das marcas registradas da Nintendo, e neste jogo conseguiram entregar puzzles inteligentes, combate e narrativa de forma tão coesa em um hardware muito limitado. Foi um verdadeiro milagre dos desenvolvedores.
O jogo é mais um excelente exemplo de como limitações técnicas podem ser superadas com criatividade. A maneira como o jogo utilizou o hardware do Game Boy Color para oferecer uma experiência robusta, digna de ser chamada The Legend of Zelda, foi maravilhosa. Isso nos lembra que a verdadeira magia dos games está nas ideias e na execução, não apenas na tecnologia.
Mais do que um bom jogo, The Legenda of Zelda: Oracle of Seasons é uma peça importante da história dos videogames que continua a influenciar e inspirar desenvolvedores. Este jogo é uma prova de que clássicos nunca envelhecem e sempre terão um lugar especial no coração dos jogadores.