Desenvolvedora: TYPE-MOON
Publicadora: Aniplex
Gênero: Visual Novel
Data de lançamento: 07 de dezembro de 2022
Preço: R$ 238,00
Formato: Digital/Físico
Análise feita no Nintendo Switch com cópia fornecida gentilmente pela Aniplex.
Revisão: Davi Sousa
Witch on The Holy Night merece uma introdução um pouco mais detalhada que muitos outros títulos, talvez por sua origem curiosa ou apenas pelo fato de que foi a história que deu início ao popularmente aclamado e expansivo Nasuverso, que conta com inúmeros spin-offs e adaptações para diversas mídias.
Mahoutsukai no Youru, carinhosamente apelidada de Mahoyo, tomaria forma pela primeira vez em 1996 em forma de livro, mas nunca chegou a ser publicada de fato devido à falta de interesse editorial pela obra. No entanto, anos após a formação da TYPE-MOON, Mahoyo foi então lançada em 2012 pela primeira vez em forma de visual novel. Porém, em 2022, através de um relançamento em HD para consoles e PC que conta com gráficos atualizados e dublagem, Mahoyo veio finalmente a ser lançada no ocidente sob o título de Witch on the Holy Night.
Por muitos anos, Witch on the Holy Night foi uma história que viveu apenas na imaginação dos fãs, considerando que era de conhecimento público que de fato existia uma história anterior a Tsukihime que aborda os primórdios do Nasuverso, que pouquíssimas pessoas tiveram o privilégio de ler.
Desta forma, é notável que tanto Fate quanto Tsukihime possuem alguns dos clichês que foram criados em Witch on the Holy Night, como protagonistas dividindo o mesmo teto enquanto precisam defender a cidade de ameaças mágicas e o contraste que é traçado entre uma protagonista feminina de personalidade forte e explosiva com um garoto extremamente inocente que é incapaz de fazer qualquer mal a alguém. Por conta disso, à primeira instância, pode parecer que a história é mais do mesmo para quem já é familiarizado com o Nasuverso e não possui esse contexto, de que na verdade trata-se de uma história que serviu como um pilar para a criação dessas outras obras.
A mansão no topo da colina
Witch on the Holy Night se passa no final dos anos 1980 na cidade de Mizaki, que é supervisionada pela família Aozaki. Na história, acompanhamos Aoko Aozaki, que divide o protagonismo com Soujyuro Sizuki e Alice Kuonji. Aoko é uma garota descendente de uma linhagem muito antiga de magos, tendo, desta forma, herdado os segredos mágicos de sua família no lugar de sua irmã mais velha por motivos que não convém no momento, para evitar spoilers. No momento em que a história começa, Aoko está morando na mansão Kuonji junto com Alice, que atua como uma espécie de mentora para a garota.
Por Witch on the Holy Night ter uma história slow burn, isto é, o plot demora bastante pra avançar, passamos os primeiros capítulos acompanhando a chegada de Soujyuro, que morava em uma sociedade completamente isolada nas montanhas, com pouco acesso à tecnologia e à civilização no geral. Soujyuro é tão alienado a conceitos mundanos que noções básicas de convivência e civilização moderna precisam ser ensinadas a ele. Por este motivo, Aoko acaba sendo encarregada de mostrar para o rapaz a escola, além de tutelá-lo a respeito do funcionamento das atividades escolares.
Logo de cara, a dinâmica entre os dois é estabelecida. Aoko está constantemente assumindo um papel “dominante” acima de Soujyuro, que constantemente se irrita com a sua ingenuidade. O atrito entre os dois vai se intensificando cada vez mais enquanto a relação entre Alice, Aoko e Soujyuro vai se tornando o pilar principal da história, trazendo inúmeras consequências para a vida dos três.
Além da história principal, Witch on the Holy Night possui uma sessão chamada Archive, que contém uma série de histórias secundárias que são liberadas conforme se vai avançando nos capítulos da VN. Cronologicamente, cada história secundária é feita para ser lida imediatamente após a sua liberação no Archive, visto que deixar para lê-las em outros momentos pode acabar confundindo o leitor com a ordem dos acontecimentos. As histórias presentes no Archive, apesar de secundárias, são bem interessantes e ajudam a alimentar a lore, além de tornar a cidade e o dia a dia dos personagens um pouco mais orgânicos.
Mesmo sendo histórias secundárias e não necessárias para o entendimento geral do enredo, elas são altamente recomendadas, considerando que o nível de escrita continua o mesmo. Certamente reviravoltas empolgantes ou coisas do gênero faltaram aqui, mas aqueles que apreciam o aspecto mais slice of life de Mahoyo com certeza não vão se arrepender de dedicar um tempo a mais a todo o seu conteúdo secundário.
Quieto como a noite
Algo que pode ser dito a respeito de Witch on the Holy Night é que trata-se de uma visual novel cinética e que, diferentemente de Tsukihime e Fate/Stay Night, a história segue apenas um rumo; isto é, o jogo não possui qualquer tipo de escolha que muda ou bifurca a narrativa em diferentes rotas que levam a finais alternativos. No entanto, temos uma história concisa e bem amarrada, com uma narrativa que dedica todos os seus esforços a uma única rota, cujo final é uma catarse de toda a construção minuciosa que foi desenvolvida até então.
Em contraste às histórias mais megalomaníacas do Nasuverso, como o próprio Fate/Stay Night e seus diversos spin-offs, Witch on the Holy Night se dispõe a contar uma história mais pé no chão, por assim dizer, com mais elementos que remetem a uma realidade mundana com bastante foco no aspecto slice of life do universo que está sendo desenvolvido. Parte disso é o que torna Mahoyou uma história tão brilhante e digna de uma leitura minuciosa. A VN passa as suas horas iniciais cuidadosamente construindo o ambiente, a cidade, personagens e o clima do jogo, e neste período aprendemos sobre como cada personagem se comporta, suas motivações, o estado mental em que eles se encontram, além de termos um gostinho do que seria a dinâmica entre cada um deles, o que posteriormente se tornaria o catalizador dos eventos mais importantes da obra.
Em suma, Mahoyou é uma novel sobre o mundano e o sobrenatural em contraste. As estruturas do mundo mágico sofrem consequências diretas do que acontece no que seria o “mundo normal” das pessoas que não são capazes de usar magia e não têm noção de sua existência. Kinoko Nasu também usa da dinâmica entre a sociedade da magia e o mundo normal para tecer alguns comentários sobre organizações que visam o beneficio particular e a manutenção de um status quo em oposição ao bem comunitário, mas infelizmente nada disso é muito bem aproveitado, visto que o jogo se dispõe a mostrar uma fração muito pequena daquele mundo, ao mesmo tempo que abre brecha para possíveis cenários que poderiam contemplar histórias maiores.
Algo que chama a atenção na escrita de Kinoko Nasu em Mahoyou, especificamente, é a forma com que o autor contextualiza os sistemas de magia e tudo que é sobrenatural acerca da história, algo que nem sempre é feito da maneira mais natural possível. Por mais que a VN seja escrita em terceira pessoa, estamos constantemente alternando entre uma perspectiva mais focada em Soujyuro e Aoko. No caso de Soujyuro, o personagem é muito usado como uma forma de introduzir o leitor aos conceitos da obra, considerando que o garoto é tão alienado no que diz respeito ao funcionamento básico de uma cidade, relações sociais além da magia e tudo que acontece de magico em volta de Aoko e os demais.
Isto implica dizer que absolutamente tudo, desde o funcionamento mais básico de normas sociais até a magia mais complexa, precisa de um momento inteiro dedicado à explicação detalhada de cada aspecto daquele mundo. É como se a escrita sofresse um pouco para encontrar caminhos mais naturais de mostrar alguns desses elementos de maneira mais prática, ao invés de só ter Aoko descrevendo para Soujyuro tudo o que está acontecendo diante dos olhos inocentes dele. Essa abordagem por vezes se torna um pouco cansativa, visto que o autor não poupa esforços para certificar-se que a magia está sendo explicada detalhadamente.
O que brilha à luz da lua
Artisticamente falando, Witch on the Holy Night é o que pode ser considerado uma visual novel de alto orçamento, considerando os padrões do gênero. Até interações mais simples, como conversas entre dois personagens em uma sala, recebem um tratamento especial, com takes de câmera imersivos que mostram os personagens de diferentes ângulos, alternadamente com imagens dos cenários, que, por sinal, são extremamente detalhados e o maior ponto forte de toda a parte artística do jogo.
Os personagens são desenhados por Hirokazu Koyama, que já havia trabalhado com a TYPE-MOON anteriormente e consegue emular bem o traço clássico de Takachi Takeuchi, artista e co-fundador da empresa. Os personagens não chamam tanta atenção quanto os cenários, mas ainda são marcantes e expressivos o suficiente para não criar uma discrepância entre a qualidade dos personagens e do ambiente.
No geral, Mahoyo possui poucas cenas de ação, mas, quando acontecem, todas têm um impacto grande devido à sua apresentação, efeitos de magia e ataques que possuem animações únicas e efeitos sonoros que dão vida às batalhas e ajudam a entregar o impacto e a magnitude dos poderes de cada personagem. Realmente, o que é apresentado em Witch of the Holy Night é de um primor técnico e artístico impressionante até mesmo para os padrões atuais, ainda mais considerando que a VN foi lançada originalmente em 2012.
Mais um ponto de Witch on the Holy Night que vale a pena ser destacado é a sua trilha sonora. Desde músicas a efeitos sonoros, a obra sucede em criar uma ambientação imersiva que combina muito bem com a proposta da história. No que diz respeito às musicas de Mahoyou, a VN conta com peças de piano lindíssimas, faixas etéreas e até interpretações de peças clássicas, como Gymnopédie No.1 de Erik Satie. Toda essa faixa musical, somada ao silêncio e efeitos sonoros que são utilizados de maneira pontual, ajudam a dar vida e estabelecer o tom de cada cena com excelência, que pode variar de momentos mais engraçadinhos na escola ou na cidade até os momentos mais soturnos e sérios na mansão Kuonji.
A bruxa na noite sagrada
Apesar de fazer parte de um universo muito maior, Witch on the Holy Night é uma história contida em si mesma, um pequeno pedaço que representa o catálogo de visual novels da TYPE-MOON. Com direção e escrita impecáveis, esta é sem duvida a melhor porta de entrada para aqueles que desejam conhecer o universo criado por Kinoko Nasu, além de ser uma recomendação fácil àqueles que ainda têm preconceito com obras do gênero.
Prós:
- História cuidadosamente construída;
- Excelente escrita com um ritmo bom e imersivo;
- Segmentos de batalha impressionantes;
- Artisticamente impecável;
- Trilha sonora marcante.
Contras:
- Alguns temas não são muito bem explorados;
- Explicações demais as vezes quebram o ritmo de leitura.
Nota Final:
9
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