
O jornalismo de games, em nosso país, é algo demasiadamente recente. A sua chegada data do momento em que o mercado de jogos começava a ganhar espaço no cenário nacional, na passagem dos anos 80 para o 90. De início, o conteúdo estava atrelado a algo mais panfletário. Nesse período de experimentação, o público alvo era o infanto-juvenil, já que o videogame – apesar da relevância e de movimentar já rios de dinheiro mundo afora – ainda era um produto associado a brinquedos diversos. Nesse sentido, a linguagem das primeiras revistas era mais acessível – justamente por buscar dialogar com um público mais jovem – e cercada de propagandas que visavam incutir no leitor o desejo de consumir os produtos por eles abordados.
Os grandes veículos de informação, já há muito haviam passado pelo processo de industrialização que segmentou uma visão mais empresarial dentro das redações. Assim, as pautas já estavam ligadas à mentalidade capitalista do lucro. Não havia, dessa forma, espaço dentro dessas grandes empresas para um produto de nicho e de pouco apelo comercial junto ao público leitor. As primeiras revistas especializadas de jogos surgem, portanto, fora desse círculo empresarial que cerca a imprensa brasileira. Não que a ótica do lucro não estivesse presente, mas como essas pequenas empresas estavam buscando estabelecer um novo tipo de mercado, isso acabava ficando para segundo plano.
Uma grande aventura começou

O investimento era uma grande aventura. Não se sabia muito para onde ir e o que esperar de retorno. A primeira revista brasileira a tratar sobre videogames data dos anos 80, encabeçada por Mauro Ivan Marketing Editorial e pensada como parte da campanha publicitária da Philips, que estava produzindo consoles baseados no sistema Odyssey. A Odyssey Adventure servia como guia para aqueles que quisessem se aventurar no mundo dos jogos eletrônicos. Com oito edições, entre 1983 e 1986, a revista – que possuía tiragem trimestral – trazia matérias sobre jogos, campeonatos e uma seção de cartas dos leitores. Ela, no entanto, não podia ser adquirida nas bancas de jornais, mas sim através de um programa de assinatura chamado de Odyssey Clube.
Nos anos seguintes novas tentativas de revistas especializadas nesse segmento foram surgindo, como a Ação Games, Super Game, Power Game e Gamer. Todas permaneceram em atividade no país por um certo tempo, mas tiveram o mesmo fim. Desde o início, no entanto, essas mídias, por mais que fossem componentes do meio jornalístico e tivessem profissionais competentes – como Marcelo Duarte, Matthew Shirts e Igor Andrade – não tinham a mesma atenção no cenário nacional em comparação a outras revistas e periódicos de maior tiragem. Contribui para isso, é claro, o produto que é vendido nessas revistas. Até porque, no Brasil, videogames são aparelhos de difícil acesso para as famílias. Principalmente, nos anos 80 e 90, uma época marcada por uma profunda espiral inflacionária.
As travas da lógica empresarial

A lógica empresarial, nesse sentido, travou o crescimento dessa linha editorial, restringiu o foco desses materiais à um público infanto-juvenil e ajudou a criar um imaginário social e coletivo que não trata os profissionais da área com o mesmo valor daqueles que abordam um jornalismo com pautas política, esportiva ou econômica. Com a popularização da internet, no início dos anos 2000, houve uma transposição de parte desse trabalho jornalístico para o mudo digital. Muitos canais passaram a mesclar videogames com outros aparatos tecnológicos, fazendo com que os mesmos tivessem que dividir espaço com outros assuntos. A democratização possibilitada pela internet, no entanto, permitiu certa perda do monopólio da antiga mídia especializada. Os fãs passaram a cobrir o hiato deixado pela falta de representatividade desse tipo de jornalismo em nosso país, fazendo com que sites como o nosso querido NintendoBoy surgisse, por exemplo.
O jornalismo gamer, no Brasil, hoje mais do que nunca, parece seguir a lógica de imprensa artesanal tratada por Nelson W. Sodré, em História da Imprensa no Brasil. Pois, mesmo diante dos bilhões que a indústria de jogos movimenta, temáticas baseadas nesses produtos só ganham vida mediante o esforço do trabalho de blogueiros, streamers e influenciadores digitais. Não poucos são os casos de divisões dentro de certas empresas, focados em videogames, serem fechadas, deixando profissionais desamparados em busca de uma nova alocação dentro do mercado de trabalho, como foi o caso do Canaltech, recentemente. Essa instabilidade e falta de compromisso, em prol do lucro, é algo que afeta a todos que fazem cobertura da indústria do entretenimento no geral, infelizmente. Quem não se lembra, por exemplo, do encerramento do Loading, meses após sua estreia na TV aberta?
Pela valorização dos profissionais
Deixar os gamers desinformados sobre o cenário nacional e internacional do mundo dos jogos eletrônicos é o menor dos efeitos negativos do fechamento dessas divisões. Estamos falando da vida de vários profissionais que não sabem até quando irão permanecer empregados, que são diminuídos por alguns leitores ou obrigados a atuar na informalidade, como freelancer. A rotatividade e a desvalorização no meio são gigantes. A romantização que alguns jornalistas amadores fazem da área – que acreditam ser suficiente para cobrir a indústria apenas o recebimento de uma chave de um jogo de uma grande distribuidora – ajuda na precarização desses profissionais e a manter essa linha editorial às margens do que vemos na grande imprensa. Ver canais vinculados a grande mídia, como Voxel, The Enemy e IGN Brasil, ainda em atividade, é um alívio. Mas, sempre fica a interrogação: “até quando?”.
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