Desenvolvedora: WildArts Studio
Publicadora: Dear Villagers
Data de lançamento: 5 de dezembro, 2023
Preço: R$ 109,00
Formato: Digital
Análise feita no Nintendo Switch com cópia fornecida gentilmente pela Dear Villagers.
Revisão: Davi Dumont Farace
Estou em um verdadeiro conflito sobre como começar esta análise. O meu dilema: não quero iniciar uma review sobre um jogo indie original citando outra franquia muito maior, porém, Born of Bread é tão claramente inspirado na franquia Paper Mario, que me parece quase desonesto não deixar claro aqui, logo de cara, a ligação entre os dois.
Em todas as mídias vemos cada vez mais estúdios buscando recriar o que já foi sucesso, seja com remakes ou “novos” produtos que são sucessores espirituais de grandes sucessos. De forma geral, vejo esse movimento com maus olhos e normalmente é resultado de companhias bilionárias buscando lucro da maneira mais simples e direta possível. No mundo dos games, no entanto, esse fenômeno adquire uma faceta diferenciada, vemos pequenos desenvolvedores buscando reviver estilos de jogo que grandes empresas talvez não considerem mais como algo viável ou lucrativo, deixando um nicho de fãs saudosos implorando pelo retorno de uma franquia ou estilo específico de gameplay.
Dentro deste contexto, Born of Bread claramente busca trazer de volta um estilo de RPG muito específico, que foi criado em Paper Mario 64 e consagrado em Paper Mario: The Thousand-Year Door, antes da franquia mudar completamente de rumo nos jogos seguintes. Nesta análise então, tentarei analisar o game pelos seus próprios méritos, mas também irei avaliar se ele é uma boa pedida para os “viúvos” da versão mais fina do lendário bigodudo.
Concebido em um fogão
O início do jogo já é bem galhofa e fica claro que não há aqui nenhum compromisso com a seriedade. A história começa quando o famoso chefe Papa baker testa uma receita secreta de pão que ao invés de resultar em um pão comum, gera Loaf (pão), nosso protagonista, que claro, é calado e se expressa apenas com o rosto. Daí pra frente surge uma jornada bem inesperada, que envolve, entre outras coisas, parar um grupo de vilões que busca restaurar um antigo império que tomará o lugar do pacífico reinado atual.
A coisa toda é non sense mesmo e busca em muitos momentos gerar humor através disso, misturando trocadilhos com pão em cenas chaves do jogo. Não há em quase nenhum momento aqui uma busca por uma mínima dramaticidade no meio de todo esse ridículo, o que na verdade difere um pouco da série Paper Mario, que vez ou outra conseguia trazer uma seriedade inesperada nas mais ridículas situações.
Antes de falar mais sobre a escrita do game, gostaria de destacar uma característica positiva que notei logo de início: o jogo tem uma apresentação bem competente, temos os personagens e alguns itens de “papel”, em 2D, com os cenários completamente modelados em 3 dimensões, o que traz o contraste clássico da série Paper Mario, com o detalhe de que os personagens são super expressivos e bem desenhados, o que traz muita personalidade para o elenco do game.
Gosto muito quando em algumas cenas o jogo brinca com a perspectiva e as câmeras ou mexe nas caixas de diálogo, usa caixa alta e muda a velocidade em que as letras aparecem. São elementos de muitos jogos clássicos de caixa de texto que sempre gosto de ver sendo bem utilizados por que mostram uma expressividade específica e marcante.
Não tão engraçado mas simpático
A escrita de Born of Bread é, de forma geral, pouco inspirada. O jogo tenta na maior parte do tempo ser engraçado, não há exageros nem super piadas, mas é simpático e divertido de ler. No entanto, raramente o jogo consegue alcançar um tom mais épico ou até mesmo dramático. Para mim, o ponto mais forte da narrativa do game foi os personagens. O grupo de companheiros na jornada de Loaf é bastante simpático e cada um deles tem um razoável desenvolvimento, inclusive há uma subversão de expectativas divertida no último companheiro que se junta ao time na jornada.
Há também uma preocupação de manter a relevância de cada personagem durante toda a jornada, e não só no momento que ele é introduzido ao time. Gosto sempre de ver RPG’s modernos atentos a esse clássico problema de diversos games antigos. O grupo de vilões também é razoavelmente carismático e traz uma dinâmica um pouco diferente, já que em diversos momentos acompanhamos o que está acontecendo também com os vilões e não só com os mocinhos.
O grande problema é que o conjunto de tudo isso traz uma história que fica na média, o que é um pouco decepcionante levando em conta que até nos jogos mais atuais da franquia Paper Mario a escrita ainda é bastante refinada e criativa, mesmo que se escore constantemente em piadas e trocadilhos.
Vale destacar que por não ter o histórico da franquia Mario, é difícil para Born of Bread recriar o humor específico da franquia, que muitas vezes acaba tirando sarro dos próprios personagens do Universo Mario, colocando-os em situações inesperadas e brincando com as expectativas do jogador.
Tá na hora de amassar o pão
Honestamente, no combate não há muito espaço para erro, considero a fórmula aqui utilizada bastante divertida. É o clássico sistema de batalha de turnos com um acréscimo infalível: cada ataque é básicamente um mini-game de apertar um botão na hora acerta, ou soltar na hora certa ou balançar o analógico para um lado e para o outro o mais rápido que puder. É simples, mas efetivo, e torna o sistema de turnos mais dinâmico e desafiador, exigindo não só estratégia, mas reflexo também.
O presente para os fãs de Paper Mario é que o jogo traz o clássico sistema de upgrades e experiência, ausente nos jogos mais recentes da franquia de papel do bigodudo. Ao subir de level, você pode escolher se quer melhorar seus pontos em HP ou em outros atributos necessários para realizar ataques especiais. Também é possível fazer upgrade para utilizar mais armas ou insignias que podem dar vantagens durante a batalha.
É um sistema de batalha praticamente copiado e colado de Paper Mario: The Thousand-Year Door e honestamente não tenho nem do que reclamar, as batalhas nunca se tornaram algo maçante para mim e algumas lutas contra chefes trouxeram uma pequena, mas bem vinda dificuldade, que me fez repensar minhas estratégias.
Vale deixar claro no entanto que ainda é um sistema de combate relativamente simples, assim como Paper Mario, Born of Bread pode ser considerado uma espécie de RPG para iniciantes, perfeito para aqueles que acham Final Fantasy, Persona e afins muito complexos e recheados de opções.
Alguns engasgos
Me incomoda um pouco quando um jogo como Born of Bread, que tem como proposta trazer de volta um estilo de gameplay mais antigo, não se propõe a modernizar esse estilo e realmente avançar a fórmula. A exploração do mundo no jogo é um problema. Por exemplo, caso você queira ir para qualquer canto do mapa, precisa viajar “a pé”, sem um sistema de fast travel para deixar tudo mais acessível. Isso particularmente me incomodou porque em algumas side-quests o jogo pede para que você retorne para áreas que já visitou e isso se torna especialmente irritante, considerando que você precisa não só refazer caminhos mas também enfrentar monstros novamente.
Outro resultado disso é que apesar do jogo tentar fazer tudo direitinho, ficou faltando alguma novidade a mais para que ele realmente pudesse se destacar como uma experiência única e original. Gostei do visual, dos personagens, do combate, mas sinto que é um jogo que fica na superfície, não mergulha nas próprias ideias para tentar trazer uma experiência que me deixasse grudado à tela da TV.
Ainda sobre engasgos, tive alguns pequenos problemas técnicos com a versão do Switch. A maioria são pequenos erros de hitbox que não interferem muito na experiência. Mas em um momento específico toda vez que eu fazia algo em certa ordem, o jogo congelava; depois de reiniciar e fazer em ordem diferente, solucionei. Acredito que os desenvolvedores já corrigiram essa questão porque saíram novos patchs desde que comecei a jogar e no geral tenho a sensação que eles estão dedicados a corrigir todos os problemas.
Uma experiência na média
A minha conclusão sobre Born of Bread é dividida: por um lado acho que o jogo foi feito com muito apreço e claramente por pessoas que são apaixonadas pelo gênero e pelo que estavam fazendo, por outro sinto que o jogo não conseguiu manter meu interesse por toda a experiência. Não que tenha sido uma dificuldade imensa finalizar o game, mas em diversos momentos me vi com pouco interesse para continuar a aventura e desvendar o que iria acontecer.
Por conta disso, acho difícil recomendar esse jogo para você que está lendo esse texto. Acredito que ele vá ser interessante principalmente para os fãs de Paper Mario avaliarem se é um bom sucessor espiritual ou não. Para mim o jogo fica muito aquém da franquia do bigodudo, principalmente pela escrita menos inspirada. Ainda assim, o visual, personagens e o combate pode ser suficiente para capturar a atenção de algumas pessoas. Por isso, talvez seja uma boa ideia não descartar esse jogo por completo.
Prós
- Visual super caprichado;
- Personagens cativantes;
- Fiel recriação do combate clássico de Paper Mario.
Contras:
- Narrativa pouco inspirada
- Não avança a fórmula Paper Mario
- Alguns problemas técnicos
- Ausência de PT-BR
Nota Final:
7
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