Coluna feita baseado na chave de Samba de Amigo: Party Central fornecida gentilmente pela SEGA
Revisão: Davi Dumont Farace
É difícil de acreditar, pra quem está jogando vídeo games por mais de duas décadas a essa altura do campeonato, mas há entusiastas da indústria, hoje, que nunca tiveram a oportunidade de jogar um console feito pela SEGA, talvez nem sequer tenham visto um pessoalmente em toda sua vida. Mas é a realidade na qual vivemos… O reinado de uma das maiores potências dos vídeo games existe somente em histórias, retrospectos no YouTube de quem viveu a época, e o legado. E o espaço que preenche atualmente no mercado é de mais uma das tantas publicadoras 3rd Party presentes em todas as plataformas, mesmo que ainda seja uma das mais notórias.
O Brasil, especialmente, é um território em que a SEGA prosperou em seus dias de rivalidade com a Nintendo, que chegou formalmente muito tarde no país, e demorou pra se estabelecer e criar raízes (o que torna a legião de Nintendistas de hoje ainda mais impressionante). Do momento em que um terceiro pilar entrou na concorrência na era 64 Bits da 5ª geração de consoles, um imenso elemento estranho na conversa, foi quando as coisas mudaram de figura para sempre e aconteceu algo que abalou completamente os alicerces do que conhecíamos nos games.

E falando como alguém que viveu durante essa era, mesmo que no fim, o saudosismo é inevitável dos meus momentos agradáveis com o Master System, o Mega Drive na casa de amigos, adoro meu SEGA Saturn etiquetado pela Tec Toy (que comprei anos depois)… e tenho minha relação de amor e ódio com o Dreamcast, que tive a chance de experimentar ao visitar parentes mais velhos, quando ainda era novidade. Sem falar dos inúmeros jogos de fliperama, como Daytona USA, Virtua Fighter e o, pra sempre no meu coração, Sonic the Fighters (ou Sonic Championship). A SEGA jamais foi a mesma do momento em que eles anunciaram a saída definitiva da briga de consoles, e o mercado também mudou completamente. Em alguns termos para melhor, mas em suma, é uma mudança de paradigma, de direção que faz a Nintendo a única representante dessa filosofia antiga.
A briga da Nintendo com a SEGA nunca foi lá muito saudável (inclusive, diria bem tóxica, e responsável por criar maus hábitos entre consumidores que infelizmente tem persistido até hoje), mas o balanceamento da linha de produção entre as gigantes japonesas era o tempero dos vídeo games. Duas empresas que apenas visavam o melhor para games, idealizavam as melhores histórias e, acima de tudo, as duas ao mesmo pé, apenas produziam vídeo games… Não havia nenhum tipo de produto adicional que mantinha as finanças em estabilidade, tudo dependia dos jogos e consoles, que estavam carregando a marca nas costas. O risco era grande, e as apostas ainda mais altas, e foi assim que num período curtíssimo entre meados dos anos 80 e início dos anos 2000 que a indústria de vídeo games cresceu absurdamente, consagrou uma imensidão de franquias icônicas e efetivou a mídia, o hobby, a experiência e a arte como válida nos olhos de um público maior.
E mais uma vez, a indústria jamais atingiu esse pico novamente… Sim, temos a tecnologia, artistas talentosos e verbas milionárias para superproduções Hollywoodianas hoje, mas proporcionalmente, há pouquíssimos pontos que demonstram evolução e marcos icônicos na última década, comparada aquele pequeno período onde tudo era pixelado ou lowpoly. Cada lançamento era crucial para o avanço de game design, criação de gêneros inéditos, lapidação de gêneros já conhecidos e à todo momento a introdução de novos clássicos.
Além da óbvia interpretação de “no meu tempo, as coisas eram melhores”, a reflexão do texto vai além… Embora a aparente estagnação da indústria seja uma nuvem constante, a luz no fim do túnel tem sido a iniciativa da SEGA de proporcionar que suas propriedades menores tenham uma chance num espaço onde eles já não mais dominam; Sim, Like a Dragon, Football Manager, Puyo Puyo, Phantasy Star, a marca licenciada da Hitsune Miku, todas as suas tangentes da Atlus como Persona e Shin Megami Tensei e discutivelmente seu mascote Sonic the Hedgehog, continuam em chão firme, mas há valor em ver títulos como Samba de Amigo: Party Central e Super Monkey Ball Banana Mania injetar nova vida nessas IPs (menções honrosas vão para títulos como Sakura Wars de 2019 e ChuChu Rocket! Universe em outras plataformas);

Jogando o mais recente título da série Samba de Amigo, foi justamente o estopim que me fez pensar sobre a SEGA de ontem, comparar com a SEGA de hoje, e o que significa a posição dela nesses dois ambientes tão diferentes de mercado. Essa é uma franquia que foi concebida na época onde a SEGA dava seus últimos suspiros com sua própria plataforma (embora seja original dos fliperamas, foi portado mais tarde para o Dreamcast), onde o negócio era mais que apenas vender um jogo, mas vender o console e também periféricos! E claro, maracas foram produzidas para o jogo rítmico do simpático macaco Amigo;
Assim que anunciaram o descontinuamento do Dreamcast, uma boa parcela de jogos 1st Party da SEGA receberam uma segunda chance nos consoles concorrentes da geração, mas Samba de Amigo teve de esperar até o Wii, em 2008, para ser apreciado novamente! Os Wii Remotes casavam perfeitamente com o conceito. Não coincidentemente, a franquia entrou mais uma vez em hibernação quando nada similar estava disponível, até recentemente, com o reaparecimento da oportunidade com o Nintendo Switch e seus Joy-Cons, completos com HD Rumble, perfeitos para Party Central.
É um jogo fundamentalmente raso, que vive e morre pelo entusiasmo do jogador de se mexer e entrar na brincadeira. Mas é algo que só existiria no espaço da SEGA como dona da sua própria plataforma, dosando seus lançamentos com múltiplos gêneros, arriscando por ter noção de sua audiência no seu próprio ecossistema. Hoje, requer muito mais para convencer o público, ainda mais num mar de jogos de ritmo que podem ou não oferecer mais, contando apenas com a sorte do mascote ser reconhecido por sua presença nos jogos de corrida crossover da empresa.

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Além dos esforços internos da SEGA de revisitar suas séries menos populares, há também a incrível iniciativa de licenciar suas franquias encostadas para estúdios Indies e publicadoras menores a fim de continuar seus legados, como foi o caso de Streets of Rage 4 (e novamente, menção honrosa vai para o Kickstarter de Shenmue III, que basicamente foi o pontapé inicial), ou revitalizar o interesse com remakes e remasters como foi com Alex Kidd in Miracle World DX e Wonder Boy: The Dragon’s Trap; Mesmo que seja apenas para tirar da reclusão e permitir que alguma opção viável esteja disponível de gemas como Panzer Dragoon e The House of the Dead.

Não há apenas flores, obviamente. Há quem diga que remakes podem adulterar demais a visão de um clássico, relançamentos ainda continuam a apresentar problemas técnicos em jogos que deveriam ser simples de portar (vide o lançamento de Sonic Origins). E ainda há uma lista enorme de títulos que nunca foram tocados nem mesmo em coletânea alguma, franquias esquecidas como Eternal Champions e o emaranhado de arame farpado que é a arquitetura do SEGA Saturn ou a falta de investimento em emulação, que também se aplica a biblioteca do Dreamcast.
Continuo firmemente com as devidas críticas sobre a SEGA como corporativa. Recentemente com uma demissão em massa, dado o cancelamento de um dos seus títulos mais caros (que surgiu de um impulso de uma bolha de mercado)… Isso não muito tempo depois de um gasto milionário em um estúdio de desenvolvimento mobile.
Claro, um joguinho 8-Bits, que nem mesmo é a melhor versão disponível, numa coletânea básica em preço inflado não é exatamente ideal para preservar e apresentar dito título para novas gerações… Nenhuma empresa faz esse tipo de coisa por altruísmo ou mesmo pelo bem da preservação dos games. Mas, quando diz respeito à disponibilidade de seu legado, a licenciatura de suas marcas, ainda que haja muito e muito a aprimorar, em passinhos pequenos, é algo que faz essa indústria cinza ter mais um pontinho iluminado, representando uma fração do que eram vídeo games, em um ciclo de vida inteiro atrás.
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