
Desenvolvedora: Marvelous, Neverland
Publicadora: Marvelous/XSEED Games
Data de lançamento: 05 de Setembro, 2023
Preço: R$ 139,99
Formato: Físico/Digital
Análise feita no Nintendo Switch com cópia fornecida gentilmente pela XSEED Games.
Revisão: Davi Sousa
Há 17 anos, Rune Factory chegava ao Nintendo DS oferecendo uma combinação inusitada de RPG de fantasia com farm/life sim. Tal combinação, no entanto, não seria tendência até 2020, quando a pandemia do COVID-19 forçou a indústria de videogames a encarar com uma visão mais otimista experiências que pudessem ser convenientes durante o período de quarentena; nisso, jogos de exercícios e os “cozy games” entraram em evidência.
Quando falo de cozy games, de fato estou incluindo Animal Crossing: New Horizons, além das variadas experiências indies neste âmbito. Mas acredite, os jogos farm sim, como Harvest Moon e STORY OF SEASONS, também se encaixam nesta categoria devido à forte presença de aspecto social in-game para além do simulador de fazendinha, que, pasmem, é uma combinação bastante agradável para quem procura por jogos aconchegantes.
Já Rune Factory une o farm/life sim com RPG de ação, tornando-o uma boa opção para os amantes do gênero que querem adentrar esta tendência que foram (e ainda são) os cozy games. Contudo, foi apenas com a explosão desse tipo de jogo que de fato Rune Factory viu seu novo auge de popularidade na pós-era DS/Wii, trazendo um novo frescor à franquia que hoje parece mais viva do que nunca, além de inspirar títulos notáveis como Sakuna: Of Rice and Ruin, Kitaria Fables, Fae Farm e HARVESTELLA — sim, até a Square Enix fez o seu próprio “Rune Factory-like’.
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Feita a contextualização, o ponto é que, graças à popularização dos cozy games, a série Rune Factory pôde se levantar mais uma vez, garantindo novas entradas, como Rune Factory 5 e outros dois projetos inéditos no horizonte, além das versões “Special” de joias do passado, como foi com Rune Factory 4 (2012) e Rune Factory 3 (2009) — este último, claro, que será a estrela deste texto.
Bem-vindo à cidade de Sharance!
Deixando de lado as questões de lore e misticismo que envolvem o mundo de Rune Factory — que eu tenho certeza que vocês não estão interessados em saber —, nesta aventura assumimos o papel de Micah, um híbrido de humano e monstro que acorda em uma cidade pequena sem suas memórias. Acolhido por uma jovem chamada Shara, ele recebe então uma oferta para morar no interior da Sharance Tree, uma árvore gigante.

Mesmo em um mundo de fantasia, nada é de graça; porém, certamente é mais em conta que uma kitnet de 20m² em São Paulo. Em troca da estadia, você terá que cuidar das terras agrícolas da cidade. Este será o seu ganha-pão a partir de agora e, como é de praxe na série Rune Factory, obter recursos de qualidade de vida e bons equipamentos/acessórios para se aventurar por aí requer poder monetário. Por isso, investir no seu pedacinho de terra é de suma importância!
Quanto ao seu problema com amnésia, bem… ele na verdade está correlacionado à progressão da narrativa. Explico: Micah é excepcionalmente forte e altruísta; por conta disso, acaba ajudando os habitantes de Sharance a resolver incidentes inesperados. Estes, por sua vez, acabam levando-o a conquistar as dungeons cidade afora, cujos temas baseiam-se nas estações do ano.
Estas dungeons, no entanto, escondem orbes misteriosos que, ao serem tocados, trazem à tona fragmentos de memórias de Micah. Por causa disso, o jovem herói se vê determinado a conquistá-las, sob a ambição de saber como chegou à situação em que está. Simples e objetivo, não é mesmo?
Além disso, à medida que progride, Micah descobre mais sobre o mundo em que vive e o que estava fazendo antes de entrar em estado amnésico. Em paralelo, Rune Factory 3 aborda bem superficialmente o tema da harmonia racial, no qual o protagonista se encontra em meio a uma relação discordante entre humanos e uma raça chamada Univir, que possuem aversão uns aos outros devido a acontecimentos do passado, cujos motivos nem eles sabem, a princípio.

Rune Factory 3 trabalha seu design narrativo de maneira despretensiosa e pouco inventiva, sendo direto no que quer propor desde o início, porém sem enganar o jogador com um enredo que pode ser engrandecido a longo prazo. Resumidamente, é uma experiência lúdica; dito isso, aqueles que estão habituados a JRPGs de histórias fantásticas e repletas de camadas talvez saiam com um gostinho agridoce, embora não tenha sido o meu caso.
Ademais, apesar de minha experiência com a série não vir desde seus primórdios, eu realmente consigo entender Rune Factory 3 com clareza. O coração da série como um todo definitivamente não está na história, mas sim em um conjunto à parte dela que exalta a sua identidade. O que quero dizer é que a história é essencial, sim, mas é apenas um complemento de algo muito maior que a franquia tem a oferecer, e é disso que irei falar a seguir!
Agro é vida

Como supracitado, a série Rune Factory traz um conjunto de jogabilidade única que dinamiza a experiência do jogador, indo da típica simulação ao combate e exploração, tudo bem harmonioso e conciso. Contudo, na minha opinião, a “experiência Rune Factory” se dá mesmo pelo seu aspecto social e gerencial, que, enquanto role-playing, serve como um complemento que expande seu núcleo, além de quebrar aquele loop que é de praxe em jogos com viés de simulação. Mas vamos primeiro falar do farm sim, que é o nosso “brincar de fazendeiro.”
Na qualidade de agricultor, Micah trabalha todos os dias em sua horta para gerar seu pé de meia enquanto expande o valor econômico da cidade de Sharance. Cultive o solo, plante sementes, regue com água, e após a plantação totalmente desenvolvida, colha para vendê-las.

Entre outras nuances que compõem a atividade, é importante ressaltar que existem sementes que se beneficiam da época do ano. Portanto, quando for à loja comprá-las, certifique-se que esteja na época certa para plantá-las; caso contrário, você acordará com suas plantas murchas após dedicar-se ao máximo no dia anterior. Entre outros cuidados, é necessário observar quando o mês irá virar — que é quando a estação muda —, pois uma vez que isso acontece e sua plantação estiver em seu ápice, tudo que estiver fora da época irá simplesmente murchar.

De fácil entendimento e execução, o ato do plantio ou jardinagem é descomplicado e acessível; contudo, ele pode demandar uma grande atenção por parte do jogador. Negligenciar a alternância entre as atividades do jogo e deixar o cultivo de lado trará agravantes à experiência como um todo. Por exemplo: optar por rushar a história e deixar o resto de lado fará com que sua progressão pessoal seja severamente afetada; não ter dinheiro para investir nos recursos necessários é como ser jogado nu no campo de batalha: você simplesmente não consegue evoluir direito.
Em suma, crie sua rotina na cidade antes de sair dela para a aventura. Após acordar, vá direto revisar o campo e faça as interações necessárias e só então saia para “grindar” ou desbravar uma dungeon. Para além disso, você também pode construir um Monster Barn para criar os monstros que recruta durante a aventura. Alguns, como o Wooly, um monstro similar a uma ovelha, podem ser criados pelo interesse de gerar lã e vendê-las, enquanto outros são cuidados para servir de companion.
Vamos à ação?
Embora eu tenha dito que os elementos de simulação se sobressaem aos elementos de RPG, não dá para negar que eles ainda integram a essência de Rune Factory; caso contrário, seria apenas um STORY OF SEASONS de fantasia medieval. Bem, o role-playing ainda faz parte da progressão geral, embora eu tenha pensamentos sobre como ele funciona, já que não considero o estilo de combate de ação e exploração tão inventivo ou polido como deveria ser.
Não tenho muito o que explicar aqui: o estilo de combate, como supracitado, é um estilo de ação livre, porém subdesenvolvido. É claro que, como em todo bom action-RPG, é essencial ter um vasto leque de armas para uma melhor diversidade de gameplay, e isso Rune Factory faz muito bem! Você pode usar armas tradicionais ou cajados de magia elementar, e até mesmo seus equipamentos de farm podem ser usados para dar uma surra nos monstros. O que não falta é diversidade.

Contudo, como eu disse que tal sistema é subdesenvolvido, quero aproveitar para falar sobre o quão impreciso ele é. Por exemplo: você estará rodeado de monstros programados unicamente para te atacar. Você então poderá aplicar combos neles, mas enquanto performa esses combos, seu personagem fica vulnerável a ataques do próprio inimigo que já está sendo atacado, já que não há uma interrupção/cancelamento da reação do monstro.
O resultado é que o momento do combo pode sabotá-lo por completo, com a possibilidade de você ficar atordoado ou morrer durante a performance. Isso me ocorreu demais, tanto em batalhas de chefes quanto nos inimigos comuns, sendo algo que foi perpetuado nos títulos subsequentes. Outro problema é que não é fácil acertá-los com golpes a distância (às vezes nem de perto haha), o que foi corrigido com um esquema de mira em Rune Factory 5, parecido com The Legend of Zelda: Ocarina of Time — sim, é um tanto quanto retrógrado.

Em suma, não acho que seja questão de eu ter alguma aversão ao estilo de combate de ação no geral. Eu consigo encontrar sistemas bem desenvolvidos nos clássicos da série Ys, por exemplo. A questão em Rune Factory 3 e na série como um todo é que ele simplesmente não me é atraente — é simples e defeituoso. Mesmo Rune Factory 5, que teve espeço consideravelmente grande para aprimoramento, adicionando elementos interessantes, ainda se manteve preso à fórmula clássica.
Porque nem tudo na vida é trabalhar

Admito que a interação entre personagens é o que mais me agrada em Rune Factory. Assim como o fator farm sim, o life sim da série é o que sustenta toda a sua base, oferecendo personagens cativantes e individuais, dos os mais excêntricos aos mais estereotipados.
Você poderá explorar histórias paralelas retratadas por meio das interações para com os cidadãos de Sharance, cumprindo solicitações que aumentam seus respectivos níveis de amizade. Além dos NPCs com os quais interagimos no dia-a-dia, Rune Factory 3 ainda oferece 11 pretendentes amorosos com os quais Micah poderá chegar aos finalmentes.
Contudo, ainda de maneira conservadora, a versão “Special” infelizmente não possibilita que o protagonista se relacione com o elenco masculino, apenas com as solteironas. Tal decisão também foi mantida em Rune Factory 4 Special, onde apenas na entrada mais recente foi possível o romance entre pessoas do mesmo sexo.
De todo modo, seja dando presentes ou cumprindo as supracitadas solicitações, você aumenta o nível de amizade daqueles com os quais você deseja uma aproximação mais íntima. Ao alcançar o nível 10, que é quando acontece a declaração de amor, você pode pedir a mão da pretendente em casamento, cujo evento é desbloqueado em uma sidequest antes de terminar a campanha.

Não é só para isso que serve o nível de amizade. Aumentá-lo também garante que os habitantes passem a confiar mais em você, a exemplo da Monica, a irmã caçula da Shara, que no início o odeia profundamente pelo simples fato de que ela não se dá bem com estranhos. Portanto, há bem mais camadas a se explorar para além dos interesses amoroso. A forma como Rune Factory dá vida aos personagens, mesmo que sutilmente, é o que o torna atraente.
Não posso deixar de citar a adição do Newlywed Mode, um modo de jogo de recém-casados muito fofo que apresenta um cenário especial com seu cônjuge. Você desbloqueia o episódio após o evento de casamento e pode fazê-lo com cada um dos candidatos. Embora não seja nada de mais, ainda é um pequeno estimulo de rejogabilidade. Como sou um ser transcendental que transborda sensatez e muito bom gosto, minha escolha não poderia ser outra que não a Raven, porém eu o perdoarei caso tenha escolhido Sophia ou Carmem.
O quão especial é Rune Factory 3 Special?
Geralmente não sou de entrar em aspectos técnicos em minhas análises, a menos que o jogo esteja completamente quebrado. Além do mais, não sou um sommelier de pixel e performance, mas como Rune Factory 3 Special é uma remasterização, eu meio que sou obrigado a falar um pouco dele em um tópico dedicado.
De todo modo, trata-se claramente de um retrabalho dedicado e não um soft remaster como tem sido grande parte dos resgates de clássicos da Square Enix. Entendendo que é um jogo do Nintendo DS, a Marvelous foi bem-sucedida em convertê-lo para uma só tela enquanto deixa os visuais low budget mais refinados e apresentáveis para uma nova geração de fãs de Rune Factory.
Os modelos 2D dos personagens que aparecem nas conversas estão em alta resolução e mais afastados um do outro, a proveito da proporção padrão atual de 4:9, enquanto o cenário feito a mão foi suavizado, deixando os detalhes mais nítidos do que na versão de Nintendo DS. Deixarei uma comparação a seguir:


Os modelos 3D também foram retrabalhados, mas mantendo a ideia da versão original para não destoar muito. Tanto os personagens quanto os monstros agora estão mais harmoniosos com o resto do cenário, ao contrário daquele amontoado de pixels quase irreconhecível.
No que diz respeito a adições, Rune Factory 3 Special conta com o Newlywed Mode que já citei, sendo de fato a novidade que agrega à experiência além das melhorias de qualidade de vida. Este relançamento também traz duas variantes da abertura animada Dream Wanderer, que substitui a original Happiness, cantada por Yazumi Kana na versão japonesa e por Joe Rinoie em inglês.
Vou me abster de quaisquer questões que envolvem resolução e taxa de quadros. Pelo amor de Deus, eu não tenho olhos para este tipo de coisa, não pegue no meu pé. Contudo, o que posso dizer é que a desenvolvedora fez bem nesse aspecto, pois no combate as coisas fluem como a gente espera de um RPG de ação. Sim, foi uma observação bem superficial mesmo.
Ademais, o esforço é notável e ficou bastante caprichado, trazendo um ar mais vivo ao jogo, mas ainda mantendo sua identidade. Ele está tão charmoso e retrô quanto Rune Factory 4 Special, e amo isso! Ouso dizer que é uma apresentação visual bastante característica que, sinceramente, me deixará saudades à medida que entradas mais modernizadas chegam no mercado.
Uma relíquia de outrora em todo seu esplendor
Rune Factory 3 Special é um resgate necessário das raízes da série que, ao mesmo tempo, o torna modernizado para novos fãs apreciarem. Ele fica acessível de uma vez por todas — afinal, antes você não poderia adquiri-lo de forma OFICIAL em lojas digitais. Sua precificação também está bem justa ao meu ver, custando 140 reais na eShop Brasil, sem contar os descontos agressivos de fim de ano ou outras temporadas de promoções. E nem vêm dizer que “está caro porque é joguinho de 2009”, você quer desembolsar mil reais na versão de DS?
De forma geral, Rune Factory 3 é um produto de seu tempo, quando a franquia ainda estava definindo seus moldes. Eu digo isso pois ele está evidentemente aquém de seus antecessores no que diz respeito ao seu enredo e recursos de gameplay e qualidade de vida — isso, claro, por motivos óbvios. Contudo, ele ainda apresenta ideias interessantes, como as Magic Seeds para auxílio na aventura e a alternância entre as aparências de Micah que muda seu movepool, embora não de maneira mais abrangente.
Por fim, Rune Factory 3 Special é um remaster de respeito e, de forma geral, uma experiência cativante como se espera de um título da série. Fãs que começaram por Rune Factory 4 ou 5 não irão se decepcionar, pois ele entrega exatamente tudo que se espera de uma “experiência Rune Factory.” Os que querem adentrar por uma opção mais acessível poderão apreciá-lo sem problemas, desde que entendam que é uma remasterização de um jogo para portátil, com escopo de portátil.
Prós
- Polimento visual impecável;
- Puro suco de Rune Factory; a jogabilidade de exploração de dungeon com combate de ação e o fator social/farm sim são bem-apresentados e de fácil entendimento;
- Melhorias de qualidade de vida.
Contras
- A história pode deixar a desejar aos jogadores que buscam algo minimamente interessante;
- O elenco masculino não estar como opção amorosa no remaster pode desapontar fãs que vieram de entradas mais recentes;
- Combate datado e impreciso.
Nota
8,5
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