Desenvolvedora: LocalThunk
Publicadora: Playstack
Gênero: Roguelike Deckbuilding com o tema pokêr
Data de lançamento: 20 de Fevereiro, 2024
Preço: R$ 44,99 (eShop) / R$ 44,99 (Steam)
Formato: Digital
Análise feita no PC com cópia adquirida pelo redator.
Revisão: Marcos Vinícius
Por certo tempo eu genuinamente adorava jogar Paciência Spider no computador. Há algo de gratificante em organizar cartas em sequências específicas, trocando mãos e fazendo sacrifícios para conseguir aquele espaço determinado.
Em outro momento, passei a fazer Sudoku todos os dias. A caminho do colégio, nas ruas movimentadas do Centro do Rio de Janeiro, fazia questão de pegar um exemplar de um jornal distribuído gratuitamente apenas para fazer o desafio diário. Estabelecer ordem a partir do vazio: entender o espaço exato e pré-determinado de cada número, a partir de cálculos e propabilidades: está aí um exercício que sinto falta.
Não se engane com as sinopses e com as aparências. Balatro não é um jogo de pôquer. As mãos e a pontuação podem ser semelhantes, mas não passa de mero pano de fundo. O jogo traz, na verdade, possibilidades de cálculos, que articulados em uma ordem certa permite atingir a meta estabelecida pelo handler, assemelhando-se muito mais a atividades como Paciência e Sudoku, de paciência e estratégia, do que aqueles pautados pelo blefe como o pôker.
O que torna um jogo “O jogo do Ano“
Joguei Balatro em seu lançamento, em fevereiro de 2024. Mergulhei fundo em seu sistema tão viciante e convidativo, venci algumas runs, senti-me feliz e desinstalei após boas horas de jogo. O que me trás de volta a ele, agora, é sua nomeação à Jogo do Ano no evento de Geoff Keighley (que sonha em ter a seriedade do NBoy Awards).
O interesse do jogo se renovou de forma exponencial, atraindo a curiosidade daqueles que ainda não tiveram a oportunidade de se perder em meio aos montes de cartas de coringas, naipes, tarot e planetas. Quanto a mim, passei a me perguntar, como costumo fazer: o que faz um jogo ser O jogo do ano?
Ao meu ver, tais premiações são sempre pautadas pelo interesse comercial. Caso a qualidade fosse a única concorrente, as listas deveriem ser atualizadas de forma retrativa. De modo geral, é um misto de investimento financeiro com hype de mercado e mera popularidade que pauta os nominados e as vitórias. Balatro, contudo, parece escapar da lógica.
Antecipando minha análise, acredito que Balatro é o jogo que, dentre os nomeados, mais merece o título. Afinal, a simplicidade de seu visual esconde o quão complexo e belo é seu game design, meticuloso e atento aos detalhes. Por isso, decidi escrever tal análise: uma forma de me reencontrar com uma das melhores experiências do ano e uma defesa, se não o próprio voto, ao representante de jogos fora da bolha AAA que deveriam ser mais celebrados.
Início Coringa
Não há nada complexo na descrição de Balatro. No início de uma run, você recebe cartas. Com elas, é necessário montar mãos. Cada mão pontua de forma distinta. Para ganhar cada round, é necessário bater uma meta de pontos. Dessa forma, o jogador deve contar suas cartas, descartar com clareza e fazer cálculos a todo instante, parecido com pôquer, exceto o blefe.
A questão é: a partir de certo momento, a meta de pontos escala de forma agressiva. Para alcançarmos o número solicitado, precisamos incluir modificadores, e aqui está a grande graça do título. Aqui, temos centenas de possibilidades para quebrar, ao máximo o jogo, a partir das cartas de coringa. Cada carta apresenta um efeito completamente diferente, e cada combinação transforma o jogo de maneiras distintas.
Você pode, por exemplo, ter um coringa que dê bônus em cartas de certo naipe, outro que fortaleça uma mão a cada vez que ela for jogada, e por aí vai. A partir dos acúmulos de modificadores, o jogo se torna complexo, e é responsabilidade do jogador agenciar todas as cartas compradas para alcançar as melhores pontuações.
Somam-se às cartas de coringa o baralho de tarot e as cartas de planetas. As primeiras são ativáveis em meio ao jogo, dando efeitos diversos como “transformar a mão em certo naipe”; enquanto as segundas melhoram o cálculo base das mãos. Assim, ao jogador é oferecido uma mesa repleta de oportunidades, ficando a seu critério a melhor forma de resolver aquela run.
Ainda existem outros modificadores, como as cartas cromadas e os diferentes naipes que o jogador desbloqueia conforme ele atinge certos milestones em suas runs. A ideia por trás, porém, é sempre a mesma: ampliar as possibilidades e os tipos de modificadores. Para isso, a cada turno podemos gastar nossas moedas em uma lojinha, fazendo-nos priorizar vitórias rápidas para ganharmos bônus financeiros para comprarmos mais e melhores cartas.
Loop Eterno
Assim, Balatro faz sua magia: pela matemática. A solução de bater um número de pontuação é a mesma de descobrir o número pertecente a esse ou aquele grid no Sudoku: a partir de cálculos e probabilidades, pensadas de antemão ou improvisadas, conseguimos bater o desafio. Por isso mesmo que Balatro precisa ser um rogue-like: ele é um quebra-cabeça, um raciocínio que deve ser levado até seu término, para podermos começar outro.
Claro, o visual do jogo e sua música meio onírica, disforme, apenas acrescentam à experiência geral. Os coringas são bem humorados, sempre surpreendentes, rendendo momentos de leveza em meio à concentração lógica. O melhor: a um preço acessível e compatível com seu conteúdo.
Por essas razões Balatro é, facilmente, a melhor nomeação apresentada no evento de The Game Awards. Ele é justo com sua proposta, inovando dentro de sistemas simples e intuitivos. Todo mundo deveria experimentá-lo da mesma forma como deve-se experimentar uma boa Paciência: como um exercício lógico, capaz de liberar doses regulares de serotonina.
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