
Desenvolvedora: Atlus
Publicadora: Atlus, SEGA
Data de lançamento: 19 de janeiro, 2023
Preço: R$99,99
Formato: Digital
Análise feita no Nintendo Switch com chave fornecida gentilmente pela Atlus.
Revisão: Marcos Vinícius
Persona 4 Golden é a versão definitiva do quarto jogo principal da série Persona. Tendo sido lançado originalmente para o PS Vita em 2012 – sendo uma versão aprimorada do título original de PS2 -, o renomado JRPG da Atlus finalmente chega ao Nintendo Switch junto de seu irmão mais velho, Persona 3 Portable; que inclusive também tivemos a oportunidade de escrever sobre ele:
Persona 4 foi em sua época um sucesso absoluto de crítica e de público, e dentro das proporções da franquia foi um dos títulos mais bem-sucedidos da Atlus. Hoje, 15 anos depois do lançamento original no PlayStation 2, e principalmente após o lançamento de seu irmão mais novo Persona 5, que garantiu novamente os maiores números de vendas da história da estúdio japonês (bem como o espaço da franquia para dentro do mainstream), vamos ver o quanto o remaster de Persona 4 Golden ainda se sustenta. Mas antes de cair de cabeça na análise, acho válido uma pequena contextualização da minha história com a franquia Persona.
Persona é, definitivamente, minha franquia de jogos favorita desde a infância. Já tive o prazer de jogar todas as outras versões definitivas dos jogos previamente. Isso dito, só havia tido contato com a versão original de Persona 4, sendo está minha primeira visita a versão Golden. Considero isso relevante pois embora algumas mecânicas sejam completamente novas a mim, já estou familiarizado com a mensagem trazida em Persona 4, e usarei essa chance para reavaliar a qualidade narrativa e as ideias suscitadas pelo jogo, e poder também dar uma gama maior de pontos de vistas baseada em momentos diferentes da minha vida e experiência como reviewer.
Mas já adianto que, visitar Inaba quase 10 anos após minha primeira jogatina foi uma das experiências mais prazerosas do meu histórico como reviewer, e já digo logo de cara que recomendo Persona 4 Golden a veteranos e novatos. Agora sem mais delongas, convido vocês a embarcarem comigo nessa jornada intimamente nostálgica e universalmente aconchegante.
Reach Out To The Truth
Persona é antes de tudo uma franquia de JRPG produzida pela Atlus desde 1996. A série é na verdade uma spin-off de Shin Megami Tensei, uma franquia bastante clássica no ramo que tinha em seu cerne o Dungeon Crawler, a temática que envolvia demônios – não só no sentido tradicional englobando outras figuras mitológicas como representantes do caso e da ordem – e consequência para as escolhas do jogador.
Persona então nasceu com a ideia de ao mesmo tempo incorporar um pouco espírito de Shin Megami Tensei, mas com a premissa principal de focar em estudantes. Isso não quer dizer que não existem outras spin-offs que envolvem estudantes, como Shin Megami Tensei if…, e o mais recente jogo mainline da franquia Shin Megami Tensei V que cumprem esse requisito.
A partir dessa ideia, no entanto, Persona se modificou bastante com o tempo, passando por uma revolução estrutural em Persona 3. Se antes o jogo focava em uma história mais dinâmica que lembrava um pouco mais a estrutura dos jogos originais de Shin Megami Tensei, agora ele traria uma fórmula mais calcada na vida escolar, com um calendário que traria uma das mecânicas core do Persona moderno, o gerenciamento de tempo, e até mesmo alguns elementos de Dating Sim, que te permitiria ficar próximo dos seus amigos da party e da escola.
Por fim, se Persona 3 se distanciava de Shin Megami Tensei em estrutura, Persona 4 adotou uma nova missão: se distanciar em tom, tema e até direção de arte. Não é como se o Persona 3 não se distanciasse de diversas formas, mas todo seu tema e até sua essência carregada de existencialismo conversa muito mais facilmente com seus predecessores, enquanto Persona 4 foca em uma mensagem mais otimista, universalmente identificável de modo geral e traz uma direção de arte mais alegre, colorida e positiva em todos os sentidos.

Digo isso não só por que por vezes a comparação entre predecessor e continuação é inevitável, nem somente por esses dois jogos estão sendo lançados simultaneamente no Nintendo Switch, mas sim pois considero essa progressão importante para entender o caráter e as atitudes de Persona 4 e o que a obra significou em seu tempo. Vamos nos aprofundar agora nessa atitude que o jogo resolveu adotar e como ela se traduziu na minha experiência.
Sings of Love
A versão Golden de Persona 4 já começa anunciando em sua sequência de abertura o tema mais descontraído radiante (e até um pouco psicodélico) que o jogo propõe. “Shadow World”, a música tema, leva ao extremo as propostas contidas na aventura que está por vir e provoca as expectativas do jogador, tanto o veterano da franquia quanto os acostumados com JRPGs no geral se veem desafiados pela honestidade quase espalhafatosa com que o jogo se apresenta.
Após esse inicio o jogo abre em uma tranquilidade quase bizarra da cidade de Inaba. Um dos seus primeiros diálogos do jogo, com o funcionário do posto de gasolina, é um aviso de que não se tem muita coisa para fazer naquela cidade, além de sair com os amigos. Nos primeiros dias do jogo nos deparamos com a realidade de que a tensão, o tédio e a estagnação de Inaba palpáveis desde o início se traduzem em uma sequência de assassinatos que estão acontecendo pela cidade.
Você então descobre ainda na sequência inicial que pessoas estão sendo mortas ao serem jogadas dentro de um outro mundo que pode ser acessado por pessoas específicas através de qualquer televisão. Dentro desse mundo a pessoa é obrigada a enfrentar seu próprio Shadow que, de forma simples, é a faceta de sua própria personalidade que essa pessoa busca reprimir. A partir daí o protagonista e seus amigos passam a procurar o culpado que está jogando pessoas no mundo da TV enquanto ajudam as vítimas a lidar com a repressão do lado que rejeitam.

Persona 4 tem em seu cerne essa repressão exercitada por todos daquilo que seria socialmente inadequado, mas que na verdade é parte dos que nos torna mais humanos. Tudo isso sendo expressado através da TV que é ao mesmo tempo um bastião da comunicação humana e globalização da época, mas também uma fonte de alienação e fofoca até certo ponto. O jogo é permeado desses boatos que remetem a ideia de que todo esse sofrimento e repressão podem ser no final só entretenimento para quem exerce a apatia que o jogo parece desesperadamente combater, e o faz muito bem valorizando ao máximo a relação entre os personagens que protagonizam a história.
Se em Persona 3 os designs de personagem e suas personalidades um pouco mais caricatas esbanjam carisma e impacto no primeiro momento, Persona 4 no entanto se esforça em fazer esses personagens serem mais humanos, desajeitados e constrangidos, desesperados por conexão e aceitação e sendo motivados apenas pela intimidade única que eles adquirem após aceitarem quem são através do apoio mútuo. O próprio protagonista desse jogo, em comparação com o seu predecessor Yuki Makoto, que carrega um ar de mistério intoxicante e uma imprevisibilidade poderosa e hipnotizante, representa o cerne do jogo. Aqui Yu Narukami é incrível pela estabilidade e honestidade além da obstinação pela verdade que o personagem representa.
Acho que posso afirmar com bastante segurança que, a mensagem de Persona 4 ressoou muito mais para mim agora, como adulto, que 10 anos atrás, como adolescente. Isso não só pela natureza da mensagem e da problemática, pois eu como adolescente queria desesperadamente saber quem eu sou e não rejeitava nada, mas pela maturidade da solução de que na verdade você sempre ainda é você. Não acho exagero considerar que Persona 4 Golden iniciou uma longa reflexão sobre minhas relações comigo e com os outros, e por isso eu considero que ele fez excelente trabalho em transmitir sua mensagem.
Time to Make History
Nem só de mensagem vive Persona 4, não é mesmo? Pelo contrário, boa parte do tempo passamos explorando as dungeons do jogo dentro do mundo da TV, logo vamos falar da exploração. Persona 4 Golden me deixa dividido na exploração, ela é essencialmente bastante parecida com a do Persona 3, com longos andares gerados de forma aleatória. Mas nesse jogo temos diversas dungeons completamente diferentes, dando mais variedade visual.
Ainda assim, acho Persona 4 um pouco mais econômico como um todo, o que tem seus pontos positivos e negativos, por exemplo: a cura do jogo custa bastante dinheiro fazendo com que o jogador possa precisar gastar mais tempo explorando a dungeon, já que ir embora e retornar no dia seguinte restaura completamente a mana e vida do jogador. Isso coloca o jogador sempre no limite, fazendo com que ele sempre necessite administrar da melhor forma possível sua mana e seu tempo, e pode fazer com que acabe tomando alguns game overs aqui e ali. Isso dito, esse jogo adicionou Quick Saves e opções mais práticas para que o jogador muito raramente precise voltar a tela de título caso falhe.

Ainda assim, acho que os inimigos desse jogo não são tão intuitivos e não te recompensam tanto por prestar atenção quanto os do jogo anterior. Mas isso é com certeza um detalhe bem pequeno, e é com certeza compensado em todos os aspectos pela qualidade excepcional das boss fights, que frequentemente compensam o jogador muito mais pela sua capacidade estratégica e de identificar padrões dos inimigos que pelo seu nível, por exemplo, pude passar a maioria das lutas do jogo abaixo do nível recomendado mesmo na dificuldade “difícil”.
Por fim, os membros da party também são muito bem feitos em questão de moveset e recebem agora habilidades específicas e exclusivas para o Persona baseado no nível de amizade com o jogador. Além de claro os follow-ups e outras mecânicas que tornam tudo mais fluído e variado baseado também na sua amizade com os outros personagens.
No mais ainda é o bom e velho combate da franquia Persona, você ganha turnos extras ao acertar uma fraqueza, você pode se defender usar uma skill item ou ataque básico em suma, e caso derrube todos os inimigos com golpes de fraqueza ou críticos você ganha acesso a um all-out-atack.
Snowflakes
Além da personagem Marie, uma novata na velvet room que conta com sua ajuda para conhecer mais sobre o mundo e si mesma, e de alguns eventos específicos que eu prefiro guardar a surpresa, Persona 4 Golden, ainda tem algumas outras funções de QoL.
Como supracitado, está versão de Persona 4 Golden possui Quick Save que auxilia muito o jogador ao permitir o save em qualquer situação mesmo dentro das dungeons. Um Fast Foward também foi adicionado em relação a versão original do Golden, onde ele pode ser ativado na maioria dos diálogos do jogo, deixando jogadores menos pacientes pularem os diálogos mais repetitivos e aumentando exponencialmente o fator replay.

Uma opção que eu senti falta no entanto é que na versão de PC é possível controlar o menu com o mouse além de com as setas ou controle, logo, uma adaptação para o touch na versão portátil seria incrível e dinâmica, mas não foi implementada. E falando na versão portátil, é bastante satisfatório ver que, embora P4G não seja novo, nem graficamente impressionante, ele mantém toda a qualidade na versão portátil, algo que infelizmente mesmo nos jogos mais simples é uma constante absoluta.
Por fim, temos outros benefícios naturais da versão Golden em si como a retirada da aleatoriedade das recompensas de um Shuffle Time, que agora depende apenas das escolhas do jogador e tem até um novo sistema para caso o jogador colete todas as cartas disponíveis.
Persona 4 Golden ainda é mais liberal na maneira que você distribui seu tempo e recheia as lacunas de jogo de conteúdo, e um bom exemplo disso é que agora você tem a possibilidade de fortalecer seus social links do dia a noite, enquanto tanto na versão original do jogo, quanto no seu antecessor as atividades noturnas eram bem escassas. Ele realmente parece um jogo bem mais denso e completo que sua versão original, e isso é algo que ele faz de forma muito orgânica e louvável.
Pursuing My TrueSelf
Embora Persona 4 Golden seja uma excelente versão definitiva de um excelente jogo, ainda acredito que ele carregue alguns problemas estruturais da ideia original. O jogo se desdobra em torno do mistério de quem é o assassino em série da cidade de Inaba, e é bem fácil perceber que talvez a demora para obter essa resposta em um RPG de 100 horas pode ser um pouco entediante, fazendo com que alguns arcos da história quase pareçam filler em alguns momentos, pois você sabe que eles não estão te deixando diretamente mais perto da resposta.
O senso de progressão em relação às respostas para o mistério não são tão bem cadenciados com o salvamento de pessoas de dentro da TV e isso torna o ritmo da aventura meio quebrado. Ainda assim, pela essência do gerenciamento do tempo e a quantidade admirável de coisas que o jogador tem para fazer o tempo todo, isso pode passar facilmente despercebido. Mas isso alinhado ao fato de que as dungeons são bastante repetitivas após certo ponto (por serem basicamente desprovidas de level design), tendo pay off narrativo quase nulo, e somado ainda ao fato de quem não estiver na party não recebe experiência e você precisar de mais tempo explorando do que sente que é justo pode tornar alguns arcos da história um pouco desmotivadores.

Acho que no fim das contas isso pode ser facilmente superado ao jogar nas dificuldades mais baixas onde você precisa se preocupar menos com seu nível, e ainda menos em ser econômico com sua mana em confronto com a letalidade das dungeons. O que leva ao fato de que a cura de mana desse jogo por exemplo é bem cara e eu nunca senti que valia apena usá-la basicamente, o que é uma pena, pois sinto que o jogo está me desestimulando a aproveitar o tempo de forma mais otimizada.
De qualquer forma, essas duas falhas do jogo são bem pequenas quando vistas no plano geral das coisas, se em alguns momentos a história pode ficar morna, o jogador ainda tem dezenas de motivadores para continuar, seja o combate divertido fluído e engajante, a relação com os amigos ou até mesmo a curiosidade de chegar no próximo arco.
Never More
Persona 4 Golden é uma experiência refrescante e intensa ao mesmo tempo, espalhafatosamente elegante e essencialmente genial. A intimidade criada aqui e a força dos relacionamentos além da evolução dos personagens durante a história é sublime e consigo ver argumentos consistentes que poderiam os elevar a melhores da franquia embora não pense assim de fato.
O combate econômico expansivo e redondinho foi realmente um ponto alto que eu não esperava aproveitar tanto, ele não é revolucionário, mas conversa e valoriza a atenção e investimento do jogador, o que é sempre empolgante e recompensador. A quebra da unidimensionalidade dos personagens como tema, dentro de uma obra com tantas camadas e pontos de vistas do próprio tema e desses personagens se entrelaçam perfeitamente bem com a ideia da planicidade que a TV representa em algum ponto e as cores RGB que permeiam o tema ao lado do amarelo vibrante e esperançoso.
Persona 4 Golden apesar de não ser perfeito foi uma experiência excelente em forma conteúdo e substância e deixou em mim uma impressão que conseguiu refletir na minha forma de ver as coisas na vida real e isso por si só já garante o lugar dele como uma recomendação universal da minha parte.
Prós
- Mensagem interessante;
- Lutas contra chefes muito redondinhas;
- Direção de arte e combate de excelência.
Contras:
- Eventuais problemas de ritmo;
- Valor desbalanceado de cura da mana.
Nota Final:
10
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